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Islã vive crise sem precedentes, diz especialista
DA REDAÇÃO
O islã enfrenta o pior momento de sua história, pois exclui "qualquer forma de pensamento". A afirmação é do escritor tunisiano Abdelwahab
Meddeb, 46. A seguir, trechos
da entrevista.
(PDF)
Folha - O islã e o mundo árabe
estão em crise? Por quê?
Abdelwahad Meddeb - Sim, o
islã está doente, atravessa o
pior momento de sua história.
Aparentemente, o islã progride, pois houve um impressionante crescimento na Ásia, na
África e em outras regiões e um
renascimento nos Bálcãs e no
Cáucaso, mas são questões superficiais. Na estrutura profunda, o islã está em crise. Distanciou-se da civilização há tempo. Agora, difunde-se só sob o
princípio da prática, que exclui
qualquer forma de pensamento. O islã seria uma entidade viva se, de um lado, tivesse retomado toda a pertinência de sua
tradição, do que produziram
sua mística, a teologia racionalista, sua tradição de exegese, e,
de outro, tentasse atualizar-se.
Folha - Os atentados produziram debates na comunidade islâmica? Em que medida?
Meddeb - Não muito, mas há
textos escritos por muçulmanos que tentam denunciar os
aspectos negativos atuais. Na
tradição, quando perguntamos
"o que é o islã?", explicam-nos
um conceito metafísico, jamais
nos dizem que seja a "sharia"
[lei religiosa". Quando perguntamos o que é o islã, nos dizem
que é o "tawhid", o monoteísmo absoluto. Hoje, muitos muçulmanos dizem que é a aplicação da lei religiosa, com todas
as aberrações. Alguns juristas
procuram colocar lado a lado
os aportes jurídicos do Alcorão
e os do Estado moderno e dos
direitos humanos.
Folha - Algum movimento tenta demonstrar que o islã vai
além da "sharia"?
Meddeb - Há intelectuais que
reagem à predominância da
"sharia". Há um escritor sírio
que diferencia na mensagem
corânica dois conceitos:
"mu'min", que seria o crente
próprio da religião islâmica, e
"muslim", que transcende o islamismo e que seria simplesmente a quintessência do espírito religioso. Por isso, diz-se
que Abraão era muçulmano.
Os que reconhecem o princípio
de Deus único, absoluto, e que
se submetem a esses princípios
se tornam muçulmanos.
Folha - Há fatores externos
que exacerbam o extremismo?
Meddeb - Sem dúvida. O principal é a política de dois pesos,
duas medidas. O fato de que os
EUA nunca exigiram de Israel a
adoção das resoluções da ONU
exacerba o ressentimento. Essa
impunidade de Israel diante da
punição de contraventores como o Iraque exacerba o ressentimento. Além disso, o Ocidente apóia aliados despóticos no
mundo islâmico. Por fim, há a
exclusão do islã, embora ele tenha participado da formação
da Europa moderna e do Ocidente.
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