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Trabalhadores e estudiosos, mas tímidos
AUTO-IMAGEM Quando se comparam com os não-orientais, descendentes de japoneses reforçam estereótipo de pessoas reservadas e esforçadas
CÁSSIO AOQUI
EDITOR-ASSISTENTE DE EMPREGOS E NEGÓCIOS
Aluno exemplar, Fernando Henrique
Hasegawa, 15, bisneto de japoneses,
faz parte da primeira turma na escala das mais
aplicadas no Colégio
Bandeirantes, em São Paulo.
No primeiro boletim deste ano,
obteve média de 9,1.
Hasegawa afirma que o segredo de seu desempenho é a
combinação de esforço, seriedade e disciplina. Para chegar à
nota dez, porém, depara-se
com um desafio: a timidez.
"Não sou muito bom em apresentações", admite ele.
O perfil do jovem estudante
não é exceção quando se trata
de descendentes de japoneses
-segundo os próprios nikkeis.
De acordo com a pesquisa do
Datafolha, os nipo-brasileiros
têm uma imagem clara sobre
como se vêem em comparação
com a média dos brasileiros.
De um lado, dizem acreditar
que os descendentes nascidos
no Brasil respeitam mais as regras na sociedade (85%), são
mais esforçados nos estudos
(80%), mais trabalhadores
(72%) e mais confiáveis (64%).
Do outro, se consideram
mais tímidos (87%), mais fechados (78%) e secos (66%) e
menos afetuosos (46%).
Essa percepção, para especialistas ouvidos pela Folha,
tem a ver com os rótulos que
lhes foram atribuídos no Brasil.
"É uma visão estereotipada dos
nikkeis por eles próprios", diz a
psicóloga Laura Ueno.
É inegável, porém, que grande parte das características
atribuídas aos descendentes de
japoneses tenha ligação direta
com as origens histórica, social
e cultural dos imigrantes.
"Há uma herança étnica de
introspecção que vem do período Edo, em que o país ficou
fechado ao mundo exterior",
diz o psicólogo clínico e intercultural Fábio Cardias.
Valores como integridade,
respeito ao idoso, paciência e
honestidade também estão originalmente relacionados com a
filosofia do confucionismo, de
origem chinesa, mas amplamente cultivada no Japão.
"Uma conseqüência do confucionismo é a valorização da
dedicação e do esforço. Japoneses usam muito a expressão
"ganbatte kudasai", que significa "empenhe-se". Já o sentimento de afetuosidade não casa com estabelecimento da hierarquia social", explica a diretora do Centro de Estudos Japoneses da USP, Junko Ota.
A importância dada aos estudos, observa Shozo Motoyama,
presidente do Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, tem a ver
com a educação que o Japão
imperial impôs aos seus súditos com o objetivo de instituir
ordem e respeito à hierarquia.
"A imigração começou no
período Meiji, em que acontece
a mudança do Japão quase feudal para o moderno. Houve um
esforço generalizado do governo japonês em prol da educação. Os imigrantes trouxeram
esses valores consigo."
Para a pesquisadora da história da imigração japonesa no
Brasil Célia Sakurai, as famílias
apostaram na educação como
meio de integração. "Para os
não-descendentes, bons resultados nos estudos significam
méritos individuais. Para os japoneses, trata-se de um meio
intergeracional de ascensão
social e financeira."
A introspecção também tem
fortes raízes culturais, segundo
Mariko Kawamura, diretora da
escola paulistana de língua japonesa Shohaku.
"No Japão, um ditado popular adverte que, quando se abre
a boca, o vento do outono a lava. Em outras palavras, o ideal
é agir sem falar."
"Nossa sociedade nunca forçou o descendente de japoneses a cortar o vínculo, como
ocorreu nos Estados Unidos",
salienta a professora de língua
e literatura japonesa da UFRJ
(Universidade Federal do Rio
de Janeiro) Sonia Ninomiya.
Com o passar das gerações,
entretanto, a expectativa é que
esse cenário se modifique. "Já
é diferente com a terceira e,
mais ainda, a quarta geração",
assinala o presidente da Comissão de Projetos da Associação para o Centenário da Imigração Japonesa, Reimei Yoshioka.
CÁSSIO AOQUI é neto de japonês. Seu avô chegou ao Brasil em 1932
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