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ARTIGO
Politicagem, corrupção e jogo baixo
LUIZ ALBERTO MACHADO CABRAL
ESPECIAL PARA A FOLHA
A utilização do propósito
dos Jogos Olímpicos da Antigüidade para torpes finalidades
políticas sempre foi uma ameaça
ao elevado ideal de competição.
Uma vez que eram considerados os mais importantes de todos
os Jogos Pan-Helênicos e uma vitória em Olímpia trazia glória
eterna não apenas ao atleta, mas
também à sua cidade natal, era
inevitável que esse evento fosse
visto como um eficiente instrumento de propaganda política.
Foi o que ocorreu com Cós e Filipe
2º, rei da Macedônia, que recorreram à cunhagem de moedas utilizando o tema dos Jogos para promoverem a sua boa imagem.
Sabemos que os atletas competiam para conquistar uma simples coroa, a qual, no entanto, valia mais que qualquer riqueza,
pela importância moral que se revestia aos olhos dos helenos. Assim, alguns campeões foram persuadidos a receber recompensas
materiais por governantes inescrupulosos que almejavam aumentar seu prestígio pessoal.
É o caso clássico de Ástilo, o
grande atleta de Crotona, no sul
da Itália, que foi vencedor do
"stádion" em três Olimpíadas sucessivas (488-480 a.C.). Na primeira, ele havia se inscrito como
atleta de Crotona, mas nas duas
seguintes, "a convite" do tirano
Hiéron, de Siracusa, ele se registrou como atleta desta cidade.
Depois do episódio, no entanto,
Ástilo foi banido de Crotona e
seus concidadãos destruíram sua
estátua, que havia sido erigida no
templo de Hera, e transformaram
sua casa em uma prisão.
Em vários séculos, as regras raramente foram transgredidas.
Entre os poucos exemplos há o do
pugilista Diognetos de Creta, que
matou seu adversário, Héracles,
durante a disputa; os árbitros recusaram-lhe a coroa de oliveira e
expulsaram-no de Olímpia.
Havia três tipos de punições: a
multa, a exclusão dos Jogos e o
castigo corporal. As penalidades
eram impostas pelos árbitros e
executadas pelos "altai", a polícia
oficial dos Jogos, e pelos "rhabdoûkhoi" (portadores de bastões).
O açoitamento, infligido pelas infrações mais leves, era uma das
punições mais brandas.
Eram excluídos todos os que haviam cometido assassinato, saqueado um templo ou violado o
armistício, fossem indivíduos ou
cidades. Esparta, por exemplo, foi
excluída dos Jogos de 420 a.C. e
multada por atacar duas pequenas cidades, Lépreon e Fírcon, durante o armistício.
Uma parte do dinheiro das
multas ia para o tesouro do deus,
isto é, para o santuário, e a outra
era destinada ao adversário prejudicado, caso houvesse um. Com
os recursos, eram erigidas as Zânes, estátuas de Zeus. Seis delas
foram erguidas pela primeira vez
na 98ª Olimpíada, com o dinheiro
da multa paga por Êupolos da
Tessália e dos pugilistas que ele
havia subornado.
Versos elegíacos foram gravados sobre as bases das estátuas
enfatizando que uma vitória
olímpica não devia ser obtida por
intermédio de dinheiro ou meios
fraudulentos, mas pela rapidez
dos pés e pela força do corpo.
Assim como as regras raras vezes eram violadas, ao que tudo indica os eleios também dispunham
de meios efetivos para controlar o
doping e as fraudes esportivas, já
que os atletas deviam se apresentar em Olímpia um mês antes
do início dos Jogos para treinarem sob a supervisão dos juízes e
provarem que haviam treinado
nos últimos dez meses.
Em Élis, cada atleta seguia um
programa predeterminado de
trabalho e de dieta, e, durante
essa preparação, os árbitros dos
Jogos julgavam os competidores
por seu caráter, força, perseverança e habilidade técnica.
Além disso, como os treinadores profissionais eram obrigados
a acompanhar o treinamento de
seus atletas, também eles estavam submetidos à rigorosa fiscalização dos árbitros.
Luiz Alberto Machado Cabral é professor de língua e cultura neo-helênica
no Instituto Educacional Ateniense de
SP. Traduziu, do grego, "Os Jogos Olímpicos na Grécia Antiga" (ed. Odysseus)
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