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Londres abriga "o último dos exilados"
DA REPORTAGEM LOCAL
Em 1968, a redação do departamento brasileiro da
BBC em Londres era bem diferente. Uma equipe de cerca de dez pessoas- um
quarto da atual- produzia
os noticiários, transmitidos
ao Brasil apenas pelas ondas
curtas do rádio.
Foi quando o jornalista e
escritor Ivan Lessa, 68, desiludido com o Brasil militar,
conheceu o escritório no
qual até hoje trabalha. "Os
brasileiros escutavam muito
a BBC na época porque não
brigávamos com a notícia.
Falávamos em golpe, não em
revolução. Estávamos longe
da censura", disse Lessa à
Folha, de Londres.
Depois de analisar o Brasil
à distância por mais de três
anos, ele aceitou convite dos
amigos para atuar no "Pasquim", no qual escreveu artigos memoráveis.
Muita pressão e três processos depois ("Dois enquadrados na Lei de Segurança e um por ferir a moral e bons costumes, aquelas coisas simpáticas da
época..."), decidiu retomar
o trabalho na BBC.
Em 1978, pegou o avião
para se auto-exilar em
Londres e nunca mais pisou no Brasil. "Tive muita decepção, feito a Maria
Louca, que saiu batendo
os tamancos e dizendo:
"De cá, não quero levar
nem a poeira". De certa
maneira, repeti o gesto,
porque o Brasil estava
muito, muito chato. A
censura...", relembra,
dando sinais de que
prefere esquecer.
Sua mãe mudou-se
para Portugal em 78, e
Paulo Francis ("amigo de infância"), fora
do Brasil desde 71, ia
visitá-lo em Londres.
"Não queria ver o
que estavam fazendo do meu Rio. E o
pessoal foi morrendo. Se fosse amanhã
ao Rio, telefonaria
para o Jaguar e o
Millôr [Fernandes,
seus parceiros do
"Pasquim']. Indo
ao encontro deles, seria assaltado e me chatearia", diz.
Autor da coluna "Livros e
Autores", produzida para
internet e rádio, ele não se
incomoda por estar próximo das notícias brasileiras,
mas longe do público. "Antes da internet, tínhamos
cartas de ouvintes. Mas era
um retorno lamentável, porque perguntavam a origem
do nome Big Ben e pediam
cartão-postal de Londres."
A BBC hoje concentra-se
no público AB, e Lessa sabe
disso. "Mesmo tendo o propalado leitor ou ouvinte
ideais, nunca consegui visualizar esse camarada."
Considerado pelos colegas
da BBC como "o último dos
exilados", Lessa é testemunha das mudanças da BBC
Brasil: "Quando cheguei, em
68, aqui estava meio pela bola sete. Hoje, a BBC transmite em 43 línguas e há enorme
interesse pelo Brasil".
E fala da longevidade na
BBC com o humor sarcástico de sempre: "Os chefes foram mudando, e eu, ficando.
Daqui a pouco, estou num
canto esquecido".
(LM)
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