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CONTAS
Balanço continua "maquiado" com artifício contábil, diz especialista
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL
A Fundação Padre Anchieta
continua a maquiar os seus balanços. Em janeiro de 2001, a Folha revelou que a TV Cultura
usava artifícios contábeis para
melhorar os seus números. A
fundação, então, alterou critérios, mas, naquelas distorções
apontadas, o balanço de 2002 ficou ainda menos transparente.
O artifício em 2001 e o atual
agravamento dessa distorção foram identificados pelo professor
Ariovaldo dos Santos, presidente
da Fipecafi (Fundação Instituto
de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras), da USP.
"O que disse em 2001 -que o
balanço estava com a cara melhorada, mais bonita, graças a artifícios contábeis- sustento. Ao
tentar corrigir, pioraram", diz.
Na quarta-feira, a Folha submeteu a Santos -responsável
técnico pelo ranking anual dos
balanços das empresas da revista
"Melhores e Maiores"- as demonstrações contábeis de 1999 a
2002 da fundação, documentos
só fornecidos pela instituição
uma semana após a solicitação
da reportagem. "Os balanços
que tinha visto em 2001 apresentavam erros técnicos. Foi eliminada a conta que mostrava esse
possível engano, mas, na verdade, a informação ficou menos
transparente", diz o professor.
Segundo Santos, naquela ocasião a fundação não seguira "as
normas contábeis geralmente
aceitas" ao escriturar de forma
inadequada, no balanço de 2000,
R$ 29 milhões de eventuais perdas com processos trabalhistas.
Com isso, deixara de admitir
que a dívida era maior do que a
capacidade da instituição de liquidá-la. A diferença (a que se
chama de "passivo a descoberto") seria de R$ 6,4 milhões.
Na linguagem técnica: a fundação classificara como "reserva de
contingência" o que deveria ser
uma "provisão". Jogara os R$ 29
milhões como "reserva" no "patrimônio líquido", quando deveria ter feito uma "provisão" no
"passivo circulante" (obrigações
a serem pagas no exercício seguinte) ou no "exigível a longo
prazo" (dívidas que vencem depois de um ano).
"Eles eliminaram a conta que
mostrava esse engano -aquilo
que chamavam de "reserva de
contingência'- e jogaram no
déficit acumulado", diz Santos.
"Acabou ficando pior. Havia um
erro que era identificado visualmente. Pegaram uma conta, que
era incorreta, e jogaram os valores dentro do "déficit acumulado", uma coisa que vem de anos
anteriores e você não tem a mínima chance de entender."
No balanço, a fundação admite
em nota explicativa (que detalha
os critérios contábeis adotados)
uma contingência trabalhista,
"cuja expectativa de êxito é remota", de R$ 17 milhões.
"Ou seja, a fundação está dizendo o seguinte: eu tenho um
passivo e vou perder, pois não tenho chances de ganhar isso na
Justiça." Mas, segundo Santos,
esse passivo foi omitido nos cálculos: "A fundação reconhece,
nas notas explicativas, que existe
o passivo, mas não o incluiu no
balanço". Ou seja, o "passivo a
descoberto" de R$ 5 milhões, no
balanço de 2002, seria aumentado em mais R$ 17 milhões. "Em
números redondos, o "passivo a
descoberto" seria de R$ 22 milhões", diz Santos.
Manoel Luiz Luciano Vieira,
diretor-superintendente da TV,
diz que a empresa de auditoria
Arthur Andersen, que auditava
os balanços, "entendeu que a
contingência estava assegurada
no fluxo de recursos que o governo tinha para sustentar o pagamento das ações trabalhistas".
"No entendimento deles, a posição daquela contingência era
no "patrimônio líquido'", diz.
"Não foi pedido nosso."
Vieira afirma que "ninguém
gostaria que o balanço fosse [da
forma] "A" ou "B'". "A TV Cultura não toma crédito, dinheiro em
banco, não faz empréstimo. Nosso balanço não retrata a situação
real da fundação. Só um imóvel
na avenida Faria Lima, que não
está no balanço pelo valor de
mercado, é suficiente para cobrir
o passivo a descoberto, sem falar
do acervo de obras de arte."
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