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ARTES PLÁSTICAS
Espaço para a projeção é inadequado, transformando a apreciação dos trabalhos em uma maratona
Mostra de vídeos no Paço faz público dormir
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Zzzzzzzz." Sentada num pufe
branco, Rita de Cássia Alecrim,
estudante do curso de Multimeios
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, dormia diante da
projeção de "Desenho Corpo", de
Lia Chaia, um dos 14 trabalhos da
mostra "O Corpo entre o Público
e o Privado", no Paço das Artes,
que termina hoje.
Das 14 obras, todas em vídeo,
dez delas são projetadas em "looping" numa mesma tela, levando
o visitante a uma maratona de
quase duas horas, se quiser conhecer todos os trabalhos da
mostra, e a disputar um dos pufes
disponíveis para maior conforto.
As outras obras são exibidas de
forma autônoma.
"Acho boa a exposição, mas caí
no sono", afirma Alecrim. Fernando Maffei, seu colega de classe, no entanto, ao saber que "Desenho Corpo", no qual Chaia risca
seu próprio corpo com caneta esferográfica até que a tinta acabe,
dura 51 minutos, preferiu sair da
sala. "Vou dar uma volta e retorno depois", afirmou.
Em vez de seduzir, espantar. Esse, afinal, é um dos dilemas da arte contemporânea. Em 2002, na
mais recente edição da Documenta de Kassel, a mostra realizada a
cada cinco anos, na Alemanha,
que costuma "ditar" novas tendências na arte, essa questão ganhou um novo patamar. As salas
com vídeo, até então desconfortáveis e acanhadas, ganharam status de sala de cinema, com arquibancadas confortáveis, dependendo da opinião do próprio artista. O inglês Steve Mcqueen, por
exemplo, projetou seus dois espaços, um diferente do outro.
Já em São Paulo, ao menos na
mostra do Paço, ecos da Documenta, em como aproximar o público do vídeo, ainda não fizeram
efeito. Segundo Daniela Bousso,
diretora do Paço, essa questão foi
discutida com os curadores da
mostra: "Para uma melhor fruição do público, eu acredito que as
projeções deveriam ser mesmo
desmembradas, mas eles disseram que esses trabalhos foram
concebidos para serem exibidos
assim, e como esse é um projeto
deles, respeitei a decisão".
O Paço, em sua Temporada de
Projetos, na qual artistas inscrevem-se para participar e são selecionados por um grupo de especialistas, admitiu, no ano passado,
o registro de projetos de curadores, e "O Corpo entre o Público e o
Privado", proposto por Arlindo
Machado e Christine Mello, é a
primeira mostra nesse formato.
"Essa exposição foi organizada
a partir de um convite do Museu
de Arte Contemporânea de Los
Angeles, em 2002, para ser apresentada em um auditório, sobre o
trabalho de uma nova geração de
artistas que trabalham com vídeo
no Brasil. Preferimos abordar o
sujeito diante das novas mídias, e
o corpo tornou-se o tema central.
Ao propor essa mostra ao Paço,
resolvemos manter o formato de
tudo ser apresentado em uma só
tela", conta Mello.
Entretanto, da agradável sala de
projeção de um auditório para
um espaço com apenas alguns
pufes, há uma grande diferença.
Tal situação não deveria ser levada em conta? "Assistir vídeo é
mesmo um problema. Não quisemos transformar os trabalhos em
videoinstalação, pois eles não foram pensados assim. Nos Estados
Unidos, tinha também o filme
"33", do Kiko Goifman, mas que
está em circuito comercial e não
pudemos exibi-lo. Também gostamos da idéia de a projeção ser a
única fonte sonora. Se criássemos
outras salas, haveria mais fontes.
É como resolver uma equação
matemática, a gente tem ainda
que aprender", afirma Mello.
Para Chaia, a artista que motivou o sono, uma solução simples
ajudaria: "Quando vou a uma exposição com vídeos, a primeira
coisa que procuro é saber a duração, assim me programo".
O CORPO ENTRE O PÚBLICO E O
PRIVADO. Mostra com 14 artistas
brasileiros que trabalham em vídeo,
utilizando o corpo como tema.
Curadoria: Arlindo Machado e Christine
Mello. Onde: Paço das Artes (av. da
Universidade, 1, USP, SP, tel. 0/xx/11/
3814-4832). Quando: hoje, último dia,
das 12h30 às 17h30. Entrada franca.
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