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COMIDA
Ovo de ouro
SABOROSO E INJUSTIÇADO, INGREDIENTE CONQUISTA ESPAÇO EM RESTAURANTES DE SÃO PAULO EM VERSÕES ELABORADAS
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um dia, cozinhando em casa
para os amigos, o chef Renato
Carioni resolveu empanar e fritar um ovo levemente cozido,
aquele de gema bem mole e clara firme, mas macia, e servi-lo
com aspargos e cogumelos.
Fez um sucesso danado. Ainda assim, o tal ovo levou um
bom tempo para sair da esfera
doméstica e chegar ao restaurante do qual Carioni é chef.
"Eu hesitei muito. Tinha medo de os brasileiros não entenderem a proposta, de não quererem sair de casa para comer
ovo e pagar quase R$ 30 por
ele", diz o chef do Cantaloup,
que, convém dizer, é aficionado
pelo alimento desde pequeno.
Tido na mais alta conta em
países como o Japão, que reverencia o seu frescor (leia à direita), e na França, de onde vieram boa parte das técnicas clássicas de cocção, o ovo tem conquistado espaço em São Paulo
em versões elaboradas.
No início, o ovo "mollet" com
ragu de aspargos e cogumelos
ao molho de parmesão de
Carioni foi vítima de olhares
reticentes e narizes torcidos.
Hoje, tem clientes fiéis que vão
ao restaurante só para comê-lo.
O "ponto crucial" é a gema estar molinha. "Gema dura ninguém merece", diz Carioni.
O preparo é trabalhoso. O
ovo tem de ser retirado da geladeira e ficar em água morna,
para não estourar quando for
colocado na água fervente, onde ficará por quatro minutos e
meio. Depois, é preciso emergi-lo em água com gelo para interromper a cocção. "O mais difícil
é descascá-lo sem quebrar", diz
o chef, que o empana com farinha de trigo, ovo e farinha de
rosca e o frita na hora de servir.
"Ovo perfecto"
Em um de seus artigos dedicados ao ovo, o físico-químico
Hervé This explica que a clara
coagula a 62ºC e a gema, a 68ºC.
Portanto, cozido a uma temperatura de 65ºC por cerca de
duas horas (suficiente para a
temperatura ser uniforme no
ovo todo), a gema continuará líquida, com o "gosto fresco de
um ovo mole", enquanto a clara
estará firme e delicada.
Esse ovo cozido a baixa temperatura foi adotado por chefs
ao redor do mundo e ficou conhecido como "ovo perfeito".
No Maní, é chamado de "ovo
perfecto" e é servido sobre uma
espuma de pupunha. Entrada
mais pedida da casa, os ovos são
cozidos a 63ºC de uma hora e
meia a duas horas no roner
-termostato usado para cozinhar alimentos em baixa temperatura. O resultado é uma gema cremosa e uma clara, macia.
"Tenho um cliente que vem
só para comer o "ovo perfecto".
Eu faço até um duplo para ele",
conta a chef Helena Rizzo.
Sem parafernálias modernas,
o chef do restaurante japonês
Aizomê, Shin Koike, prepara
seu ovo de baixa temperatura
de maneira quase artesanal
(leia receita à direita). Em um
dos pratos, recém-incorporado
ao cardápio, o ovo é rapidamente gratinado com farinha de pão
temperada e tem a companhia
de caviar e azeite trufado.
Outra estrela da casa é o "tamago-no-misozuke": uma gema superamarela, translúcida e
de consistência gelatinosa cujo
sabor se dilui aos poucos conforme a gema derrete na boca.
Gema por gema é colocada
sobre um tecido fininho que cobre uma mistura de missô e saquê mirim. Ficam "curtindo"
por cinco dias e depois são servidas ora com pato defumado
ora com filé mignon.
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