São Paulo, domingo, 11 de agosto de 2002

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BRINCADEIRA PERIGOSA

Manutenção dos equipamentos previne acidentes

Fabricante e síndico podem ser responsabilizados

Roberto Price/Folha Imagem
A atriz Cássia Kiss, 44, só deixa os filhos Joaquim, 7, e Maria, 5, brincarem no parquinho do condomínio quando ela está presente


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Não é à toa que existem mães que, quando não estão presentes, não deixam seus filhos brincarem em playgrounds, seja do condomínio ou da praça pública. A atriz Cássia Kiss, 44, mãe de Joaquim Maria, 7, Maria Cândida, 5, e Pedro Gabriel, cinco meses, é uma delas. "Acho esses brinquedos muito perigosos, mal-acabados e sem manutenção regular."
No condomínio Mansões, onde mora, na Barra da Tijuca (RJ), uma criança foi machucada por uma farpa de madeira do assento do escorregador, com ferimentos nas nádegas. "O playground ficou interditado por cerca de dois meses e sofreu reparos, mas, ainda assim, não acho confiável", diz.
Segundo ela, os brinquedos do condomínio são conjugados, o que não é recomendável. "Não respeitam a distância mínima entre um e outro", explica Osvaldo Kinoshita, perito do laboratório Falcão Bauer, que certifica produtos para o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial).
Ele diz já ter periciado casos graves, relatando dois em escorregadores: uma criança perdeu parte do dedo em uma emenda malfeita e outra quebrou o braço ao cair (não havia amparo lateral). Só no ano passado, ele acompanhou 12 na cidade de São Paulo. "Mas nenhum foi concluído. Como as normas não são obrigatórias, acabam inibindo ações na Justiça."
O playground do condomínio Amazonas, em Guarulhos (15 km ao norte de São Paulo), foi reformado há dois meses. Os brinquedos foram divididos por faixa etária. Mas ainda existem irregularidades: o piso dos escorregadores para as crianças de cinco a dez anos está em pedra miracema -o mesmo deixado pela construtora-, e o assento é de metal.

Desconhecimento
O síndico, Ricardo Mendoza, confessa que não conhece detalhadamente as normas para playgrounds e nem como consultá-las, mas diz que, antes de comprar os brinquedos, consultou especialistas. "Mas, se julgarmos necessárias, novas adequações não estão descartadas."
A reforma e quais equipamentos seriam adquiridos foram discutidos em assembléia, garante. "Evitei, por exemplo, o brinquedo conjugado, porque a empresa me disse que o espaço e o piso do prédio não eram adequados. Como sei que posso ser responsabilizado por qualquer acidente que acontecer, tive o cuidado de comprar os mais próximos do ideal."
O presidente da Aabic (associação das administradoras de condomínios), José Roberto Graiche, admite, sem estimar percentual, que a grande maioria dos síndicos desconhece as normas da ABNT. "Existe um conhecimento genérico das responsabilidades na função, mas nada em específico sobre playgrounds", diz.
O advogado Eduardo Gentil, da empresa de direito imobiliário Trust Gestão Patrimonial, escla- rece que, quando a compra dos equipamentos do playground é aprovada em assembléia, não é o caso de acionar judicialmente o síndico, em casos de acidente. "Mas o fabricante pode ser responsabilizado", explica.

Na Justiça
Ele informa que existem duas formas de acionar a Justiça. "Podem ser abertos dois processos: um criminal -cuja pena, em caso de condenação, não é pecuniária, isto é, não é indenizatória- e um civil -em que a vítima pode solicitar indenização por danos diretos e ou morais."
Já o advogado Luiz Paulo Germanos entende que só cabe responsabilizar o fabricante e o síndico na esfera civil, de acordo com o artigo 159 do Código Civil. ""Mas apenas se o primeiro tiver omitido informações sobre a inadequação ou o perigo do brinquedo, ou o segundo tiver adquirido produtos sem consulta prévia aos demais membros do condomínio."
O fabricante é o responsável por qualquer problema encontrado nos equipamentos do playground, porém, segundo o perito Kinoshita, do Falcão Bauer, quem responde civil e criminalmente por qualquer acidente dentro do condomínio é o síndico. "Ele deve ter o cuidado de instalar brinquedos adequados às normas", alerta.
De acordo com o técnico, as normas da ABNT são bastante claras: a manutenção dos equipamentos é obrigatória e o síndico deve solicitá-la periodicamente. As penas, no entanto, não estão especificadas. Como o cumprimento não é compulsório, qualquer ação penal vai depender da persistência das vítimas em fazer justiça. "Mas, se algum caso for levado à Justiça, as normas terão força sobre o processo", afirma.
(VALDETE DE OLIVEIRA)


Onde encontrar - ABNT, norma 14.350: vendas no tel. 0/xx/11/3016-7070, R$ 71,50; e consultas na biblioteca (av. Paulista, 726, 10º andar, São Paulo).



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