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Experiências oníricas na Grécia Antiga
As Portas do Sonho
184 págs., R$ 39,00
de Adélia Bezerra de Meneses. Ed. Ateliê (r. Manoel Pereira Leite, 15, CEP 06709-280, Cotia, SP,
tel. 0/xx/11/4612-9666).
Caio Caramico Soares
da Redação
Quando sonha, todo homem é
poeta", diz a crítica Adélia Bezerra de Meneses -professora
de teoria literária na USP e Unicamp- em "As Portas do Sonho", um
estudo sobre o valor cultural da experiência onírica na Grécia Antiga.
O ensaio é dividido em cinco partes. As
duas primeiras, introdutórias, discutem
temas como a "teoria" helênica de que os
sonhos seriam de dois tipos: os premonitórios e os enganosos. Estes viriam ao sonhante por "portas de marfim"; aqueles,
por "portas de chifre". A explicação dessas metáforas, segundo a autora, pode
deitar raiz na lógica do trocadilho, tão
valorizada na psicanálise: chifre ("keras") remeteria a "realizar-se" ("krainein") e marfim ("elephantínon") a "enganar" ("elephairomai"). Já a "porta"
condensaria a idéia do sonho como elo
de "mediação entre dois mundos".
Nos outros textos, Meneses focaliza
passagens da "Odisséia" e das tragédias
"As Coéforas", de Ésquilo, e "Electra", de
Sófocles, em que se narram sonhos "típicos", quer dizer, diretamente tributários
dos "arquétipos culturais" que impregnavam de sentido os céus e a terra, o dia e
a noite naquela sociedade.
Meneses inicialmente delimita a leitura
que imagens como a "serpente" ou a
"águia" receberiam à época, segundo
fontes como a "Oneirocrítica" de Artemidoro de Daldis (século 2º d.C).
Em seguida, ela "ressignifica" esses
símbolos como produtos do inconsciente, que como tais se prestariam a decifração moderna, sobretudo freudiana. Penélope, ao sonhar com a águia que destroça os gansos, estaria projetando menos a vitória de Ulisses sobre os pretendentes -sentido manifesto- do que
uma cena primordial de coito parental.
Se há arbitrariedade aqui, ela é temperada pelo caráter lúdico que Meneses dá
a suas interpretações e por um preceito
tomado a Benjamin: "O problema não é
apresentar a obra literária em conexão
com seu tempo, mas sim tornar evidente, no tempo que a viu nascer, o tempo
que conhece e julga, ou seja, o nosso".
Tal "anacronismo esclarecido" parece,
por sua vez, se articular a reflexões esboçadas pela autora no final, sobre a "delicada questão da dialética entre arquétipos culturais e símbolos universais".
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