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"O Processo", de Franz Kafka, segundo depoimento de Reiner Stach
Em "O Processo", Josef K. tem a
consciência de que faz coisas
que nem ele mesmo entende.
Reage ao processo de uma maneira diferente da qual reagiria
se usasse seu entendimento. Diz algo,
mas sua ação não corresponde ao que
pensa e fala.
A detenção inicial de fato não é uma
detenção, pois é permitido a Josef K.
trabalhar e viver seu cotidiano. Mas sua
vida desmorona, e ele tem a experiência
de que em sua cabeça existem também
outras instâncias que ele não conhece. É
a experiência de que existem em nosso
psiquismo "outras" instâncias -em
Freud, o inconsciente é uma experiência
fundamental, independentemente do
sistema cultural em que se vive.
Essa é a experiência do medo e uma
fonte permanente de pesadelos, pois
não temos acesso direto, como no processo, a essa última instância -ou software básico. Isto é, não temos o manual
de funcionamento do processo.
Descontrole dos sonhos
No livro, há dois adversários: a corte
em si e a corte na psique, e ambas cooperam à revelia do personagem. Nenhum
ser humano tem o controle absoluto sobre essa instância -"não é senhor em
sua própria casa" e não pode controlar
seus próprios sonhos.
Provavelmente "O Processo" será lido
nos próximos séculos com o mesmo interesse e, mesmo que os sistemas políticos mudem, a base existencial permanece. Nossa situação é até pior do que há
milhares de anos, pois nossos antepassados dispunham de um inconsciente, mas
não da necessidade de controlá-lo e de se
integrar ao coletivo.
Os detalhes do mundo administrado
são racionais, mas o conjunto é irracional e completamente não-transparente
-o capitalismo funciona exatamente
dessa forma.
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