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O ESCRITOR NORTE-AMERICANO DIZ QUE A LITERATURA NÃO SOUBE
EXPLORAR O TEMA DO JOVEM QUE TEM UM CASO COM UMA MULHER
MAIS VELHA, QUE FOI MAIS BEM APROVEITADO PELO TEATRO
E O CINEMA, EM FILMES COMO "A PRIMEIRA NOITE DE UM HOMEM"
Mulheres apaixonadas
Divulgação
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Cenas de "A Primeira Noite de um Homem" (Mike Nichols, 1967) |
por Paul Theroux
Quando jovem, eu tinha muitas fantasias a respeito
de mulheres mais velhas, embora raramente tentasse colocá-las em prática; quando jovem eu raramente punha qualquer coisa em prática. O hábito
de nutrir anseios provavelmente me transformou em escritor. Não são as pessoas que levam vidas ativas, cheias de
oportunidades, que costumam virar escritores, e sim nós, os
que vivemos fantasiando; o curioso é que isso nos dá um ar
de mundanos, quando na verdade somos inseguros e ansiosos, atraídos por pessoas confiantes, glamourosas e verdadeiramente mundanas.
As minhas fantasias não têm nada a ver com essa maçante
mania de defloração, com esse culto pedomórfico de rostos
e corpos, com a "starlet" de Hollywood, objeto de desejo das
canções populares, que mais parece um filhote de foca com
uma camiseta onde está escrito: "Guloseima para garotos".
A adolescente gatinha de olhos sedutores e pernas finas é o
fraco de muito velho babão, e é justamente o que um velho
babão merece. Creio que eu não saberia descrever a minha
mulher ideal, mas minhas fantasias muitas vezes giram em
torno de uma figura que lembra a sra. Robinson. Se não, por
que, aos 16 anos de idade, no cinema, vendo Ava Gardner
em "A Condessa Descalça", eu mal conseguia respirar?
Possibilidade contínua
O tema do homem mais jovem que tem um caso com uma mulher mais velha ainda me
interessa muito, porque as expressões "mais jovem" e "mais
velha" vão mudando de sentido para mim à medida que o
tempo passa. Uma mulher de 30 é velha para um rapaz de 20
anos. Não costumo andar muito com gente na faixa dos 30.
Hoje sou bem mais velho que a sra. Robinson, e no entanto o
sexo não é uma coisa teórica; é algo real, sempre uma possibilidade. Continuo olhando para as mulheres o tempo todo
e pensando: você é bonita? E, como todos os homens, reprovo algumas, aprovo outras e a umas poucas dou notas altas.
É o que faz a maioria dos homens constantemente.
Estou mais velho, mas essa questão de diferença de idade e
desejo é agora ainda mais fascinante para mim do que antes.
A idade é o ponto central de "A Primeira Noite de um Homem": a relação do rapaz com a mulher mais velha é o que
mais fica na nossa memória, e o mesmo drama ocupa uma
posição central em muitas obras-primas.
O tema é invariavelmente um homem mais velho e um objeto de desejo mais novo, normalmente uma moça, às vezes
um garoto. "Morte em Veneza" [de Thomas Mann] é a história da obsessão pelo atrativo e a perfeição da juventude: a
beleza de Tadzio e a adoração impotente que o menino inatingível desperta em Von Aschenbach. Lolita [no romance
de Nabokóv" é assumidamente o estudo clássico da paixão
de um homem de meia-idade por uma adolescente. A garota -isso fica bem claro- é um verdadeiro pesadelo, nada
tem de virginal, mas isso não desanima Humbert. É desse fato que provém o humor do romance, pois vemos Humbert
tal como ele vê a si próprio: uma vítima ridícula, porém decidida a se vitimar.
Há quase 25 anos escrevi um ensaio, "Home to Mrs. Robinson", em que tentava imaginar como seria um envolvimento com uma mulher mais velha. Eu a imaginava senhora de si, autoconfiante e muito sexualizada, um tanto dominadora e, acima de tudo, uma pessoa que sabia das coisas.
Para mim, a qualidade que a tornava mais atraente era a que
costumamos atribuir aos jovens: a capacidade de viver o
momento presente. Mas de modo geral os jovens não fazem
isso. Eles se preocupam com o futuro; não querem desperdiçar o tempo. Vivem pensando: será que isso é bom para o
meu currículo? Preocupam-se com a possibilidade de que o
sexo sem maiores compromissos prejudique sua auto-estima. Em vez de procurarem a sra. Robinson, procuram a
pessoa certa.
Homenagem mútua
Nesse texto de tantos anos atrás,
eu dizia que a mulher mais velha não está procurando marido; ela sabe o que quer, e, se o homem corresponde às suas
expectativas, ele está no papo. A mulher mais velha sabe
muito bem manter as aparências e tem uma consciência viva do tempo. Se o garoto vê no ato sexual uma prova de maturidade -de sua virilidade, mais um dado estatístico a ser
amorosamente anotado-, a mulher mais velha consegue
uma espécie de sursis, e graças ao encontro amoroso passa a
perna na sua idade. Para ela, o sexo é uma maneira de dois
parceiros homenagearem-se mutuamente, num ato privado. A situação clássica não envolve nenhum compromisso a
longo prazo; pelo contrário, a mulher pode até não querer
ver o rapaz depois. As preliminares, as meias-verdades,
as confidências, os galanteios -nada disso é necessário.
Não há tempo; ela vai direto ao assunto e depois retoma sua
vida. Ela faz com o rapaz o que os homens mais velhos fazem com as moças.
E, ao contrário de muitas das mulheres mais jovens, ela
não quer cair em nenhuma arapuca. Não precisa de testemunhas. Para os jovens, o sexo não é um fim em si e sim um
meio para obter um outro fim: emprego, dinheiro, casamento, poder, família, posição. Assim, se jamais conhecem
uma mulher mais velha e só têm relações com moças na faixa dos 20, duras na queda, os homens aprendem a encarar o
sexo como um favor que lhes é concedido -o sexo passa a
ser uma estratégia, uma moeda, uma forma de poder. Assim, o ato sexual se torna uma coisa ameaçadora. Já a mulher mais velha costuma ser indiferente à idéia de ser dominada ou de obter alguma coisa em troca do ato. A idade libertou-a dessas ilusões. Ela não está interessada em poder,
mas em prazer.
Clima de realidade
No momento em que estava escrevendo a respeito desse tema, eu era um teórico, com aquela
presunção dos 30. Escrevi: "A mulher entre 30 e 50 anos sexualmente está muito bem -ainda que seus modos sejam
frios, seu corpo pega fogo".
Agora que estou mais velho e entendo melhor o funcionamento dos hormônios, eu subiria o limite superior: as mulheres de 60 anos às vezes também são intensamente sexualizadas. E, se levaram uma vida minimamente ativa, entendem tudo do assunto. Não estou falando de amor, e sim de
desejo. Muitas ainda são belas.
De modo geral, a literatura não nos ajuda a compreender
essas defasagens etárias. Robert Louis Stevenson casou-se
com uma mulher muito mais velha que ele; Raymond
Chandler fez o mesmo. As mulheres deles eram extremamente atraentes, ainda que um pouco neuróticas. Nenhum
dos dois escreveu obras de ficção com essa temática. Turguêniev teve um envolvimento com uma mulher mais velha
e casada, porém sua melhor obra de temática sexual é a história de um homem que tem um caso com a namorada do
filho. Henry James adorava a companhia de mulheres mais
velhas, mas guardava seus abraços e carícias para homens
mais jovens. Madame de Vionnet, em "The Ambassadors",
é a sra. Robinson de James; Byron criou uma ou duas em
Don Juan. Nas obras de outros grandes escritores, como
Dickens, Melville, Conrad, Dreiser e Fitzgerald, não encontramos casos robinsonianos. A mulher mais velha não foi
bem explorada pelos ficcionistas.
O cinema e o teatro, porém, compensam essa deficiência
do romance. Os filmes que me vêm à mente são "Crepúsculo dos Deuses", "Tormento de Bergman", "This Sporting Life", "Nothing but the Best", "Doce Pássaro da Juventude",
"Em Roma na Primavera" (é também um romance, mas o
filme foi melhor), "A Cold Wind in August", "A Última Sessão de Cinema", "Almas em Leilão" e uma obra-prima de
Fassbinder, "O Medo Corrói a Alma". Deborah Kerr em "Os
Pára-Quedistas Estão Chegando" é a mulher mais velha levada à perfeição.
E, naturalmente, a sra. Robinson em "A Primeira Noite de
um Homem". O diretor, Mike Nichols, criou um poderoso
clima de realidade nas cenas do rapaz com a mulher mais
velha. A cena mais reveladora não se dá na cama, e sim num
bar em que o rapaz está fora de seu elemento e deixa que a
sra. Robinson assuma o comando.
As mulheres de 60 anos às vezes também são intensamente sexualizadas; e, se levaram uma vida minimamente ativa, entendem tudo do assunto
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Luxúria
Assumir o comando é a essência da vitalidade
sexual. A sra. Robinson é despachada, antenada, independente e sensacional. Não há quem, tendo assistido ao filme,
não lamente o final, em que o protagonista fica com a filha e
não com a mãe.
É uma bobagem associar esse desejo ao complexo de Édipo, que afinal de contas é uma coisa que tem a ver com bebês. Eu, quando penso na minha infância, quase sempre
evoco meus 10 ou 11 anos; nessa época, uma ex-colega de escola da minha mãe costumava nos visitar e, quando ia embora, deixava um odor de perfume e fumaça de cigarro, bem
como uma afrodisíaca mancha de batom no copo em que
ela tomara gim.
Lembro-me da primeira professora que tive vontade de
possuir -a senhorita Murphy, que não teria mais do que 22
anos-, embora eu não fizesse idéia de como se fazia tal coisa. A primeira mulher que entendia mais de sexo que eu era
também mais velha e mais experimentada; senti, talvez pela
primeira vez na vida, que estava em boas mãos.
Há 25 anos escrevi: "A mulher mais velha nos dá algo quase incomparável, a oportunidade de completar, na idade
adulta, o que foi impossível completar na infância, a possibilidade da lascívia sem culpa que combina o que há de melhor na juventude, maturidade, romance e realismo em partes iguais".
Continuo pensando assim. O sexo só em certos casos é
procriação; no mais, é pura luxúria, lastreada no cabedal de
imagens que trazemos da infância. A possibilidade de realizar na idade adulta as fantasias da infância é a própria definição da felicidade.
Paul Theroux, 61, é escritor e roteirista norte-americano, autor de "Minha Outra Vida" (ed. Record) e "Morte em Chicago" (ed. L&PM).
Tradução de Paulo Henriques Britto.
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