São Paulo, domingo, 22 de junho de 2008

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HÉLIO DE SEIXAS GUIMARÃES

O autor
Machado de Assis constatava, já em 1873, que havia no Brasil muito amor às comparações.
Escreveu isso antes de ser ele mesmo vítima desses confrontos. Ainda em vida, foi comparado, muito desfavoravelmente, a Tobias Barreto, Rui Barbosa, Camilo Castelo Branco, Latino Coelho, Laurence Sterne etc. etc.
Ao longo do século 20, volta e meia repontava a (falsa) questão sobre quem era o maior escritor: Machado de Assis ou José de Alencar. Durante a ditadura militar, isso chegou a ser matéria de debate no Congresso Nacional, que buscava um patrono para as letras nacionais.
Faço esse pequeno histórico para inverter os termos e refazer a pergunta: por que esse nosso renitente amor às comparações sumárias que, no limite, se reduzem a alternativas que por sua vez implicam exclusão?

A obra
"Dom Casmurro" para mim está entre as grandes realizações do século 19. Não só pelo prazer que continua a proporcionar para quem gosta de ler ficção, mas por ser um fato cultural de peso.
Não há outro romance que tenha suscitado reações tão amplas e duradouras. Isso já é um feito num ambiente cultural em que os livros, até mesmo os bons e os muito bons, com muita sorte fazem algum barulho para logo em seguida caírem no esquecimento.
Já no século 20, "Grande Sertão: Veredas" é outro grande acontecimento, que, por caminhos e com recursos muito diferentes, nos deixa em estado de encantamento e suspeição.
São livros que não só estimulam, mas acolhem com galhardia as leituras divergentes, o que me parece ser indício de grandeza, vitalidade e importância. Eles nos põem, como comunidade de leitores, diante dos nossos valores e preconceitos, das limitações da nossa capacidade de julgar, da precariedade dos juízos críticos etc.


HÉLIO DE SEIXAS GUIMARÃES é professor de literatura na USP, autor de "Os Leitores de Machado de Assis" (Nankin/Edusp).


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