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Monges visam apoio do Brasil contra junta de Mianmar
Ativistas dizem que ao menos 3.000 pessoas ainda estão detidas por protestos há um ano
Para exilados, Brasília pode usar influência externa para pressionar por embargo contra a venda de armas
ao regime militar birmanês
CLARA FAGUNDES
DA REDAÇÃO
As decisões do Brasil terão
peso na abertura política de
Mianmar (ex-Birmânia), afirmam monges birmaneses exilados que vieram ao país pedir
apoio ao embargo à venda de
armas para a junta militar, no
poder desde 1962. Para o monge Ashin Nayaka, ativista e professor visitante da Universidade Columbia (Nova York), seu
país só não é palco de um novo
levante popular semelhante ao
de setembro último porque a
repressão impede.
Falando à Folha, Nayaka disse querer que o Brasil use suas
boas relações com a China e
outros fornecedores de equipamentos militares da junta para
pressioná-los em fóruns internacionais a aceitar o embargo.
O monge agradeceu o apoio
brasileiro às resoluções críticas
ao regime, mas disse que, como
"líder no âmbito Sul-Sul" e "aspirante à vaga permanente no
Conselho de Segurança da
ONU", o país pode fazer mais.
Com os colegas Ashin Agga
Dhamma e Ashin Kawwida, da
IBMO (Organização de Internacional de Monges Birmaneses), na sede da ONG Conectas,
disparou: a cúpula militar deveria ser julgada por "crime
contra a humanidade" no Tribunal Penal Internacional -alternativa descartada pela China e Rússia, com poder de veto
no CS da ONU.
Os dois países, a Índia e a
Ucrânia são os principais fornecedores militares de Mianmar -um país pobre, mas de
vultuoso mercado militar. As
Forças Armadas consomem
cerca de 40% do Orçamento,
contra 3% gastos com saúde.
Sem inimigos externos, a principal missão do Exército é sufocar as tentativas de desestabilizar o governo, quase sempre iniciadas nos mosteiros.
"Somos uma das organizações democráticas mais antigas
do planeta", sorri Kawwida.
Sustentados por doações, os
monges birmaneses são responsáveis por serviços sociais
básicos e estiveram à frente de
grandes revoltas, como o levante contra o domínio britânico
na década de 30. "Os monges
também passam fome quando
o povo não tem o que comer",
diz Nayaka, explicando o histórico de mobilização.
Em 1988, os três Ashin participaram dos protestos pró-democracia, que culminaram nas
primeiras eleições livres em
quatro décadas. Vencida pela
oposicionista Aung San Suu
Kyi, a votação foi anulada, e
uma caçada aos opositores
abortou o suspiro democrático.
Nayaka e Kawwida deixaram o
país. Dhamma foi torturado e
preso por cinco anos. "Mas tive
sorte", diz. Libertado em 1995,
foi sorteado na loteria do
"green card" -visto que permite a imigração aos EUA.
Os monges voltaram a tomar
as ruas em setembro de 2007.
A repressão esvaziou mosteiros e resultou em milhares de
prisões. Sob pressão da ONU, a
junta escreveu uma Constituição -reservando aos militares
25% do Parlamento e a prerrogativa de dissolver o governo-
e convocou um referendo para
ratificar a Carta, que prevê eleições em 2010.
Farsa eleitoral
Às vésperas do referendo, o
ciclone Nargis varreu Mianmar, matando 80 mil pessoas,
no temporal mais mortífero do
século 21. Os militares relutaram em aceitar ajuda externa e
mantiveram a votação -nas zonas mais atingidas, o pleito foi
adiado por duas semanas.
Apesar da calamidade e dos
milhões de desabrigados, oficialmente a vitória da junta foi
esmagadora. Sem escrutínio da
oposição ou de observadores
internacionais, o governo divulgou a participação de quase
99% dos eleitores, com mais de
92% de aprovação à Carta. "Foi
uma piada", resume o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, relator especial da ONU para Mianmar de 2000 até abril último.
Denunciar a "farsa eleitoral"
e conclamar o Brasil a não reconhecê-la foi uma das principais
razões da visita dos monges, em
agosto. "Não há uma transição
democrática; as eleições de
2010 são parte do processo de
consolidação do autoritarismo", concorda Pinheiro. A Junta estendeu no mês passado a
prisão domiciliar a Suu Kyi e,
segundo a IBMO, ao menos
3.000 presos nos protestos de
setembro continuam detidos.
A reação brasileira à visita
dos monges foi tímida. Na terça-feira, a Câmara dos Deputados, cujo Comitê de Direitos
Humanos reuniu-se com os religiosos, aprovou uma nota pública de repúdio às violações de
direitos humanos. O Itamaraty
não se posicionou sobre o referendo, "questão interna do
país", e disse que não há previsão de sanções à junta.
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