|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Após anos de repressão, maioria das
afegãs ainda prefere vida encoberta
DENISE DUCLAUX
DA REUTERS, EM CABUL
Weeda Mansoor lutou pelos direitos da mulher no Afeganistão
durante 25 anos, em uma organização famosa por dirigir escolas
clandestinas para meninas e filmar secretamente as execuções
realizadas pelo Taleban, mas ela
ainda assim não sai de casa sem
estar envolta em uma burqa que a
recobre da cabeça aos pés.
"A única coisa que mudou desde o tempo do Taleban é que eles
deixaram de usar roupas sujas e
agora vestem terno e gravata",
disse Mansoor, 38, da Associação
Revolucionária das Mulheres do
Afeganistão. Mansoor, que usa
saltos baixos e um conjunto salmão embaixo da burqa, diz que o
véu a ajuda manter em segredo
sua identidade em um país no
qual os direitos da mulher podem
ser uma idéia perigosa.
Outras mulheres ecoam esse
sentimento, dizendo se sentir
mais seguras quando estão cobertas da cabeça aos pés, em uma sociedade que está emergindo de
mais de duas décadas de sangrentos conflitos. Muitas delas simplesmente atendem aos desejos
de suas famílias, que consideram
difícil romper com os costumes
que vigoram há séculos nesse país
profundamente conservador.
"A tradição de um país é mais
forte que sua Constituição; não há
como mudá-la rapidamente", diz
Soraya Rahim, vice-ministra de
Assuntos Femininos do Afeganistão. "É muito difícil, e precisamos
avançar cuidadosamente, passo a
passo."
O regime extremista do Taleban
exigia que todas as mulheres usassem a burqa em público, em seus
seis anos de domínio sobre o Afeganistão, tomando uma tradição
bastante difundida nas Províncias
distantes e fazendo-a lei nas cidades do país, mais liberais. As mulheres que não usassem a burqa,
véu dotado de uma cortina bordada de cerca de sete centímetros
que permite que vejam parcialmente o que as cerca, eram espancadas ou recebiam chibatadas.
O Taleban proibiu mulheres e
meninas de freqüentar escolas,
trabalhar, dirigir ou até mesmo
caminhar pela rua sem a companhia de um parente homem.
"Os homens desenvolveram
idéias muito ruins sobre as mulheres naquele tempo", diz Nasreen, uma afegã que ensina mulheres a ler e escrever em um país
no qual o índice de alfabetização
das mulheres adultas está entre os
13% e os 22%.
Quando forças lideradas pelos
EUA derrubaram o Taleban no
fim de 2001, os homens correram
para as barbearias para raspar as
barbas que os governantes fundamentalistas exigiam por lei que
usassem, e as mulheres saíram
sem burqa pela primeira vez em
anos. Dezoito meses depois que
um governo apoiado pelos EUA
foi empossado, muitos homens
estão desfrutando de suas novas
liberdades, usando roupas ao estilo ocidental e abandonando as
barbas. Mas a maioria das mulheres continua a usar burqas na capital, Cabul, talvez a mais estável e
liberal das cidades afegãs.
"É a tradição do povo do Afeganistão", diz, dando de ombros,
Rashed Sayeedi, proprietário de
uma loja de burqas chamada
Obedeçam a Alá em um dos movimentados mercados de Cabul.
Sayeedi diz que os negócios
continuam tão prósperos quanto
na era do severo governo do Taleban. Ele vende entre 30 e 40 burqas por dia, por cerca de 600 afganis, ou US$ 12, cada. Ele diz que as
mulheres de Cabul preferem burqas azuis, as de etnia pashtun em
geral escolhem o vermelho e o
preto e as mulheres próximas do
casamento ficam com o tradicional branco. Sayeedi tem até mesmo um estoque de burqas em rosa e roxo, para estrangeiros que
queiram levar para casa um pedacinho do Afeganistão.
Algumas mulheres afegãs não
dão importância à preocupação
com a burqa, que serve como símbolo de repressão à mulher em
boa parte do mundo ocidental.
Elas dizem que o véu é o menor
de seus problemas, e que ele não
desaparecerá até que desfrutem
de igualdade no trabalho e no governo. "Nessa situação, a burqa
não é o problema", afirma a vice-ministra Rahim. "O grande problema é que as mulheres precisam
de empregos. As mulheres precisam sair de casa. As mulheres precisam de dinheiro. Depois, poderão decidir por si sós."
Texto Anterior: Paquistão alimenta instabilidade afegã Próximo Texto: Oriente Médio: EUA diminuem pressão sobre palestinos Índice
|