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O Iraque deve ser deixado aos iraquianos
SAAD SHAKIR
DO ""FINANCIAL TIMES"
O que vai acontecer no Iraque
após o afastamento do regime nocivo de Saddam Hussein é um tema que chamou a atenção do
mundo. Está surgindo entre muitas partes interessadas um consenso em favor da transferência
rápida da autoridade do comandante militar das forças da coalizão para uma administração iraquiana de transição.
Desde que a comunidade internacional garanta seu apoio à administração e à reconstrução do
país, essa transferência do poder
em pouco tempo seria a melhor
maneira de o Iraque avançar.
O processo de transição deve ser
ditado pelos interesses da população iraquiana. Apenas iraquianos
devem escolher quem os irá governar.
Qualquer ingerência externa na
escolha dos líderes da administração transicional seria mal vinda.
Especificamente, qualquer ingerência por parte dos EUA ou do
Reino Unido não apenas seria politicamente indesejável, mas também representaria uma traição
dos militares americanos e britânicos que sacrificaram suas vidas
pela libertação do Iraque.
Para ter legitimidade, a composição do governo de transição e
sua área de competência devem
ser decididas pelo espectro mais
amplo possível da sociedade iraquiana.
O mecanismo de seleção de sua
liderança precisa ser decidido numa conferência nacional iraquiana a ser realizada em Bagdá no
menor prazo possível após o afastamento do regime atual.
Seja qual for sua forma exata,
precisa ser justo e transparente,
para garantir que a administração
espelhe a composição étnica e religiosa do Iraque.
Embora muito já tenha sido dito
sobre as diferenças étnicas e religiosas no Iraque, essas diferenças
tinham peso muito menor na vida
pública antes da ascensão do regime do Baath, que as explorou para fomentar seus objetivos próprios.
Indicações a cargos que fossem
baseadas nos méritos dos indicados garantiriam um papel de destaque às classes profissionais iraquianas, que estão entre as mais
avançadas do Oriente Médio.
Apoio total
Além da administração iraquiana proposta, precisa ser criada
uma agência da ONU no Iraque
para coordenar o apoio da comunidade internacional. Uma das tarefas mais importantes dessa
agência deve ser a de cooperar
com a administração na recuperação do setor petrolífero, como
meio de ganhar as divisas de que o
país tanto precisa.
Para dar certo, o governo de
transição precisará conseguir todo o apoio possível da comunidade internacional. Os outros países
precisam, sobretudo, abster-se de
qualquer ingerência nos assuntos
internos do Iraque. Além disso,
devem anular imediatamente as
sanções econômicas impostas ao
país como castigo pelas aventuras
militares de Saddam.
Outra tarefa dos governos estrangeiros será a de financiar a reconstrução. As expectativas da
sofrida população iraquiana irão
aumentando de maneira progressiva.
Aliviar a pressão econômica será essencial para a estabilidade
política. Ao mesmo tempo, as empresas multinacionais, especialmente as que têm suas sedes em
países de economia forte, como os
EUA, a França e a Rússia, não devem fazer lobby junto a seus governos para que estes os ajudem a
conseguir contratos de forma injusta. Considerando a vulnerabilidade da administração transicional proposta, talvez seja mais
aconselhável que os grandes contratos sejam tratados pela ONU.
Democracia
A administração transicional
precisa ter um mandato não-renovável. O objetivo político fundamental da administração de
transição precisa ser o de preparar o país para eleições democráticas, sob supervisão internacional, no prazo máximo de dois
anos.
Outras tarefas cruciais terão de
incluir o processo de ""des-Baathificação" das estruturas do Estado
e das Forças Armadas, o desmonte de todas as redes de polícia secreta e o fomento da liberdade de
expressão e da imprensa livre.
Os desafios que a população iraquiana e a administração proposta têm pela frente são enormes. Se
as coisas derem errado, as consequências negativas irão prejudicar a região inteira. Embora a população iraquiana ainda ostente
as cicatrizes de três décadas de tirania e três guerras, ela é inteligente, trabalhadora e amante da
paz. Dentro em pouco, terá a
oportunidade de reconstruir sua
vida e seu país. Os iraquianos merecem todo o apoio; o mundo não
pode abandoná-los outra vez.
Saad Shakir é professor de medicina e
partidário da oposição iraquiana
Tradução de Clara Allain
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