São Paulo, domingo, 07 de setembro de 2003 |
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Império cria "franquias" NAOMI KLEIN
O Hotel Marriott em Jacarta
ainda estava em chamas
quando Susilo Bambang Yudhoyono, ministro de Assuntos Políticos e de Segurança da Indonésia,
começou a expor as implicações
do ataque. "Aqueles que criticam
as violações de direitos humanos
precisam compreender que as vítimas de atentados são mais importantes do que qualquer questão de direitos humanos".
A presidente Megawati Sukarnoputri, da Indonésia, recebeu o mesmo memorando. Ela assumiu o poder prometendo reformar suas Forças Armadas, notoriamente corruptas e brutais, e levar a paz ao seu faccioso país. Mas, em lugar disso, suspendeu as negociações com o Movimento pelo Aceh Livre e, em maio, invadiu aquela Província rica em petróleo, a maior ofensiva militar empreendida pela Indonésia desde a invasão de Timor Leste em 1975. Depois do 11 de Setembro, o governo passou a retratar o movimento pela liberação nacional de Aceh como "terrorista", o que quer dizer que as preocupações com os direitos humanos já não se aplicam a ele. Um dos principais assessores de Megawati classificou a mudança como "uma benção do 11 de Setembro". A presidente filipina, Gloria Macapagal Arroyo, parece se ter sentido igualmente abençoada. Retratando sua batalha contra os separatistas muçulmanos no sul da ilha de Moro como parte da guerra contra o terror, Arroyo abandonou as conversações de paz e passou a travar uma guerra civil brutal em lugar disso, criando 90 mil refugiados em 2002. Às vezes, a guerra contra o terrorismo é desculpa para continuar uma guerra já iniciada. O presidente Vicente Fox, do México, chegou ao poder em 2000 prometendo resolver o conflito com os zapatistas "em 15 minutos" e enfrentar os abusos descontrolados dos direitos humanos praticados pelos militares e pela polícia. Depois do 11 de Setembro, Fox abandonou ambos os projetos. O governo não agiu para reiniciar o diálogo com os zapatistas e, na semana passada, eliminou a subsecretaria de Direitos Humanos. É essa a era pressagiada pelo 11 de Setembro: guerra e repressão desfechadas não por um único império, mas por uma cadeia mundial de franquias imperiais. Na semana passada, uma outra guerra ocupou as manchetes. Na Argentina, o Congresso revogou leis que deixavam impunes criminosos sádicos da ditadura que governou o país entre 1976 e 1983. Na época, os generais classificavam sua campanha de extermínio como "guerra contra o terror" e usaram uma série de sequestros e ataques violentos praticados por grupos esquerdistas como desculpa para assumir o poder. Mas a vasta maioria dos 30 mil "desaparecidos" nos anos da ditadura não era terrorista. Tratava-se de líderes sindicais, artistas, professores, psiquiatras. Como acontece em todas as guerras contra o terrorismo, não é o terror que é o alvo. Ele simplesmente fornece uma desculpa conveniente para que a verdadeira guerra seja travada, a guerra contra as pessoas que ousam dissentir. A jornalista canadense Naomi Klein, 33, é autora do livro "Sem Logo - A Tirania das Marcas em um Planeta Vendido" Texto Anterior: Artigos: Coragem traz esperança Próximo Texto: Mesmo acuada, Al Qaeda ameaça Índice |
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