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Instrumentistas ganhavam US$ 12
DA REPORTAGEM LOCAL
Hisham Sharaf foi o único músico da Sinfônica do Iraque a ser
ferido durante a rápida e violenta
guerra que derrubou Saddam.
Um míssil atingiu sua casa, em
Bagdá, espatifou as vidraças e deixou uma de suas mãos incrustada
de cacos de vidro.
Clarinetista, ele é também o diretor administrativo da orquestra. Sharaf disse à Folha que a turnê aos EUA é artística e não política. Eis os principais trechos da entrevista, feita sexta-feira por telefone em Amã (Jordânia).
(JBN)
Folha - Quantos músicos estarão
se apresentando nos EUA?
Hisham Sharaf - Da orquestra
propriamente dita, 52, mas teremos dez outros que tocam instrumentos tradicionais iraquianos.
Folha - As fotografias do primeiro
concerto em Bagdá, após a queda
de Saddam, mostravam a falta de
muitos instrumentos.
Sharaf - Em 27 de junho, quando
a orquestra se apresentou pela
primeira vez depois da queda do
regime, continuávamos a sofrer
os efeitos de desfalques ocorridos
com as guerras e com o embargo
comercial. Mesmo assim, estávamos com cinco violoncelos.
Folha - O sr. poderia quantificar
esses desfalques?
Sharaf - Nos anos 90 perdemos
entre dez e 15 músicos, que emigraram para a Jordânia, para a Síria e para outros países.
Folha - O que aconteceu com Abdel Razzak al Azzawi, regente titular da orquestra, que de uma hora
para outra sumiu?
Sharaf - Três meses antes que
eclodisse a guerra ele conseguiu
deixar o país e se encontra agora
na Suécia. Mohammed Amin Ezzat era o seu assistente e é ele que
estará dirigindo a orquestra em
Washington.
Folha - Como está hoje a remuneração dos músicos, já que, nos últimos anos de Saddam, o salário era
aparentemente simbólico?
Sharaf - Sempre estivemos ligados ao Ministério da Cultura. Nos
últimos tempos de Saddam o salário de um músico era em pouco
inferior a US$ 12 por mês. E era,
mesmo assim, mais do que recebiam muitos funcionários públicos. Milhares deles, pelo câmbio
da época, ganhavam apenas US$
3 mensais. Agora estamos recebendo US$ 120. Não é ainda um
salário definitivo. É uma ajuda de
custo nesse período de transição.
Folha - Os músicos tinham outros
empregos para sobreviver?
Sharaf - Eu tinha quatro outros
empregos: professor de matemática, professor de clarineta, músico de câmara e assistente do diretor da Academia de Música.
Folha - Jornais americanos disseram que houve uma discussão aguda entre os músicos sobre a oportunidade de participar de uma turnê
ao país que ocupa militarmente o
Iraque.
Sharaf - Essa discussão não
ocorreu dentro da orquestra.
Muita gente de fora dela acreditava que a turnê seria inoportuna,
sob a alegação de que tocar para o
público americano equivaleria a
tocar para o Exército desse país.
Não estamos embarcando para
Washington em missão política.
Nossa orquestra existe desde
1959. Temos uma cultura interna
anterior a Saddam e às guerras.
Folha - A orquestra já recebeu outros convites do exterior?
Sharaf - Aceitamos o convite dos
Estados Unidos e também aceitamos propostas do Dubai, para janeiro, e da Alemanha e Holanda,
para fevereiro. Somos como qualquer orquestra que gosta de se
apresentar no exterior.
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