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ELEIÇÕES NA ARGENTINA
Provável derrota enterra volta "gloriosa" à Presidência
Carisma de Menem parece ter se esgotado
GUSTAVO CHACRA
DA REDAÇÃO
A Argentina adora cultuar seus
mitos. San Martín, Facundo Quiroga, Juan Domingo Perón, sua
mulher Evita, Carlos Gardel e Diego Maradona. Na história do país,
muitos outros tentaram alcançar
o mesmo patamar, mas acabaram
malogrando.
Um deles, no entanto, sonha
quase desde a infância com esse
lugar no pedestal: Carlos Menem.
E a eleição presidencial do próximo domingo, com o resultado já
praticamente certo, demonstra
que o homem que por mais tempo governou a Argentina, entre
1989 e 99, superando inclusive Perón, fracassou no intento. O ex-presidente deve ser derrotado.
"Seu semblante nas últimas
aparições não é o mesmo. Parece
que tomou formol para ficar vivo", diz a escritora Silvina Wargen, autora do livro "Pizza con
Champán; Crónica de la Fiesta
Menemista", sobre o primeiro
mandato de Menem, 72.
Seu poder de sedução e seu carisma parecem estar se esgotando. "Ele era quase messiânico",
diz Wargen. "Uma pessoa extremamente inteligente, mas que
usava a inteligência para o mal."
Para o analista político Ricardo
Rouvier, "Menem acredita realmente que tem uma capacidade
superior à dos outros seres humanos". Isso torna ainda mais dolorosa a derrota para ele.
Ainda assim, a situação de Menem hoje, na avaliação de Rouvier, é melhor do que se imaginava há algum tempo, quando ele
esteve detido sob a acusação de
tráfico de armas para o Equador e
para a Croácia. "Apesar da derrota política, terá uma votação expressiva, se for levado em conta o
seu passado recente", avalia Rouvier. Wargen acredita que, se a
economia do país não tivesse melhorado nos últimos meses, com o
controle da inflação e a relativa estabilidade da moeda, Menem poderia até mesmo vencer.
"Parte da classe média ainda crê
que os anos Menem tenham sido
bons", afirma. "Além disso, Menem encarna bem a imagem do
argentino que faz qualquer coisa
para atingir seus objetivos." Rouvier concorda. "Menem representa tudo o que há de negativo no
imaginário sobre os argentinos: a
picardia, a astúcia, a habilidade
para manobrar as pessoas."
Sem condições de se tornar um
mito, ainda não se sabe como Menem será lembrado pela história.
Sua trajetória o coloca sem dúvida
como a mais importante figura
política da Argentina desde a
morte de Perón, em 1974.
Filho de imigrantes sírios, de religião muçulmana, posteriormente convertido ao catolicismo, estudou direito em Córdoba e, graduado, voltou à sua longínqua e
pequena Província de La Rioja
para fundar a Juventude Peronista local. Nos anos 70, elegeu-se governador. Mas o golpe militar em
1976 o levou para a prisão.
Solto e com o restabelecimento
da democracia, em 1983, voltou
ao governo de La Rioja e se reelegeu. Em 1989 se elegeu presidente.
Mal vestido, com suas costeletas,
seu sotaque caipira, seus ternos
coloridos, Menem chegou com
seu charme e suas amantes ao poder com o desafio de eliminar a
hiperinflação que assolava o país.
E, três anos mais tarde, com o
câmbio fixo e uma política de privatizações, conseguiu acabar com
o fantasma da inflação. Até 1994, o
país teve crescimento. No ano seguinte, a crise mexicana mostraria o outro lado da era Menem. O
desemprego cresceu. E surgiam
duras acusações de corrupção.
No âmbito familiar, estava separado de sua mulher, a síria Zulema, inconformada com a morte
de seu filho Carlito. Ela acredita
que Menem esconde o verdadeiro
motivo do acidente de helicóptero que matou o jovem.
Após entregar o poder a De la
Rúa, Menem se casou novamente,
com a ex-Miss Universo chilena
Cecilia Bolocco, viu seu plano de
conversibilidade arrasar o país e
teve decretada prisão domiciliar.
Posto em liberdade, decidiu disputar a Presidência.
"Ele provocou, sem dúvida,
uma grande mudança: fez com
que a Argentina deixasse de ser
estatizada", afirma Wargen. "A
única certeza é que estará nos livros de história", diz Rouvier.
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