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No Brasil, elo se dá na cultura
DA REDAÇÃO
O serviço de identificação de
ancestrais africanos por análise de
DNA ainda não existe no Brasil,
mas, mesmo que existisse, provavelmente não seria muito procurado pelos descendentes brasileiros de escravos, disseram especialistas ouvidos pela Folha.
"A identificação biológica aqui
não é valorizada", afirma Reginaldo Prandi, 55, professor de sociologia da Universidade de São Paulo. "Ser africano no Brasil é uma
identidade cultural e religiosa."
Nos final dos anos 70 e início
dos anos 80, afirma Prandi, chegou a haver uma onda, que acabou "não pegando", de interesse
de descendentes de africanos em
ir à África em busca de suas raízes.
"Eles sempre voltavam muito decepcionados. Os religiosos, por
exemplo, descobriam que a religião estava muito mais preservada aqui do que lá."
Além disso, há uma "hierarquia
de prestígio" no Brasil. "Algumas
etnias -mais estudadas por antropólogos ou mais retratadas por
artistas- são mais valorizadas.
Se você pergunta a um negro brasileiro, geralmente ele diz que sua
origem é ioruba, nagô ou gege, raramente angola", diz Prandi. "Há
uma identificação idealizada que
não passa pela prova científica."
O historiador Ubiratan Castro
Araújo, 53, diretor do Centro de
Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia, diz:
"Do ponto de vista social, a vontade de restabelecer os vínculos
com a África é suprida pelo estudo da história ou da cultura africana, principalmente do candomblé, pelo qual se estabelece uma
espécie de volta ritual simbólica".
Essa "volta simbólica" também
se dá pelo contato com a comunidade de retornados brasileiros na
Nigéria, em Benin e em Gana.
"Eles eram escravos no Brasil
que se libertaram ou foram expulsos e voltaram para a África. Não
conseguiram se reintegrar como
africanos em suas etnias, mas
constituíram uma espécie de
grande etnia de brasileiros", diz
Araújo. "Eles festejam o Bonfim,
o Carnaval, falam português."
Para ele, apesar de a iniciativa de
americanos de buscar suas origens por DNA ser importante, "o
movimento negro aqui ainda não
produziu essa necessidade".
Ele afirma que chegou a tentar
trabalhar com uma equipe da Fiocruz que usa a genética para estudar doenças incidentes predominantemente em populações negras, como a anemia falciforme.
Mas, para Araújo, as categorias
usadas nos estudos médicos são
muito imprecisas se comparadas
às etnias identificadas em estudos
histórico-antropológicos.
(MB)
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