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Novos líderes políticos enterram a Guerra Civil
DO COLUNISTA DA FOLHA
Pela primeira vez nos 25 anos
de história da democracia espanhola, os dois principais candidatos a presidente do governo (nome oficial do cargo de premiê) são
jovens que não têm como referência a participação ou a oposição à
ditadura do general Francisco
Franco Bahamonde, que governou o país do fim da Guerra Civil,
em 1939, até morrer, em 1975.
Quando Franco morreu, Mariano Rajoy (PP, Partido Popular,
centro-direita) tinha 20 anos e só
ocuparia cargos político-eletivos
seis anos depois. Em contrapartida, nos 22 anos seguintes, jamais
deixaria de ocupá-los.
José Luis Rodríguez Sapatero
(PSOE, Partido Socialista Operário Espanhol) é ainda mais jovem
(43 anos), mas tem uma ligação
familiar marcante com a guerra
civil: seu avô, o capitão Juan Rodríguez Lozano, foi executado pelas tropas franquistas em 1936.
Rajoy e Zapatero substituem as
duas figuras predominantes na
Espanha pós-franquista. O candidato conservador foi indicado pelo atual presidente do governo,
José María Aznar, que preferiu retirar-se depois de duas vitórias
eleitorais consecutivas, apesar de
todas as pesquisas indicarem um
novo triunfo de seu partido.
Zapatero (ou ZP, Zapatero Presidente, como dizem seus cartazes
eleitorais) lidera desde o ano 2000
um partido que foi comandado,
antes como depois da redemocratização, por Felipe González, carismático primeiro-ministro durante 12 anos (1982-96).
González ficou nas Cortes, o
Parlamento espanhol, durante 27
anos, mas, neste ano, não se candidatou.
Os dois novos líderes têm mais
de uma coincidência: são ambos
formados em direito, estão ambos
há cinco legislaturas nas Cortes,
passaram ambos pelo Colégio das
Discípulas de Jesus em León (norte da Espanha) e são ambos avessos à estridência.
No perfil de Zapatero que produziu para a revista semanal do
jornal "El País", José Luis Barberia descreveu-o assim: "O premiê
britânico, Tony Blair, um espelho
que Zapatero olha com o rabo do
olho, se torna até um político meridional, em contraste com o caráter nórdico do líder socialista
espanhol".
De Rajoy, na mesma publicação, Jesús Rodríguez foi ainda
mais longe: "As regras do jornalismo ditam que, na hora de iniciar uma reportagem (tipo perfil),
convém dispor de uma declaração contundente ou de um episódio com gancho que amarre o leitor desde a primeira linha. Com
Rajoy, isso é impossível. Nenhum
desses cenários se dá em sua trajetória política".
Até nos slogans que cada partido escolheu para a eleição, há certa semelhança: "Juntos vamos a
más", diz o do PP, acenando com
a continuidade das políticas de
Aznar, mas com a inescapável
promessa de um pouco mais. Já o
PSOE preferiu "Merecemos uma
Espanha melhor".
Em qualquer caso, não há nem
nos slogans nem nas promessas
de campanha acenos de ruptura.
A única grande diferença está na
política externa. O PP se aliou incondicionalmente aos EUA e defende que a Europa se aproxime
cada vez mais da única superpotência existente.
Zapatero promete retirar as tropas espanholas do Iraque e uma
política muito mais europeísta.
No mais, são "diferenças mais
de enfoque quanto ao gasto social
e questões de cultura e costumes",
diz Josep Fradera, catedrático de
história moderna e contemporânea da Universidade Autônoma
de Barcelona.
É fácil explicar a escassa diferenciação. "A margem é muito reduzida pela integração à União Européia e sua ortodoxia em política
econômica e de imigração, entre
outros assuntos", completa Fradera.
Ganhe quem ganhar hoje, portanto, parece em desuso um verso
do ícone da poesia espanhola, Antonio Machado, que dizia: "Españolito que vienes al mundo,/ te
guarde Dios./ Una de las dos Españas/ha de helarte el corazón".
As duas Espanhas fizeram a
guerra, mas seus novos líderes já
não gelam o coração dos adversários.
(CR)
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