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Para analista dos EUA, petróleo
distorce vida política venezuelana
DE NOVA YORK
A principal fonte de riquezas da
Venezuela, o petróleo, é também
a principal razão para uma cultura política distorcida, que já dura
quase meio século e que o presidente Hugo Chávez não conseguiu mudar, diz Julia Sweig, especialista em América Latina do
Council of Foreign Relations, um
dos principais centros de estudos
de assuntos internacionais dos
Estados Unidos.
Para ela, a raiz da atual crise e a
polarização no país se devem a essa distorção e à incapacidade de
Chávez de fazer um "governo de
transição". "O que esse país precisa para sair desses 40 anos de política distorcida e dependência de
petróleo?", é a pergunta que, na
opinião de Sweig, o presidente venezuelano deveria ter tentado responder.
"A classe política da Venezuela
se acostumou, desde a descoberta
e a nacionalização do petróleo, a
certas regras de jogo: a divisão dos
benefícios do petróleo. Não só entre os políticos. Até a economia do
país começar a entrar em crise no
final dos anos 70 e início dos 80,
mesmo os pobres do país, em
comparação com o resto da América Latina, viviam relativamente
bem", disse ela em entrevista à
Folha.
"Mas, à medida que os benefícios do produto decaíram, a cultura política criada em torno da
dependência do petróleo não soube como acomodar, como lidar
com os conflitos políticos e questões que todo país latino-americano enfrenta, de pobreza e desigualdade."
É, portanto, num clima de "luta
de classes" que os venezuelanos
vão hoje às urnas para decidir se
mantêm ou não um presidente
que, no entender de Sweig, repete
em boa parte as práticas políticas
que pretendeu superar ao chegar
ao poder no país.
"Paternalismo petrolífero"
"Não vejo Chávez com uma estratégia de transição", disse a analista americana. Para ela, Chávez
julgou que pudesse sobreviver
politicamente apenas expandindo sua base entre os pobres, deixando de lado questões como a
dependência econômica do petróleo e a necessidade de composição política.
A transição teria de ser, segundo
ela, "para uma economia mais diversificada e uma democracia
mais diversificada". "Para além
do sistema anterior de dois partidos, e para além de uma economia totalmente dependente do
petróleo. Essa é a transição que
aquele país precisa fazer."
Sweig explica o que vê como
permanência política e econômica, já que a transição não se deu.
"O que se vê agora na Venezuela é
novamente um caso de "paternalismo petrolífero", só que voltado
para os pobres. É difícil comprovar estatisticamente, mas os pobres na Venezuela parecem ter a
sensação de que estão agora recebendo comida, educação e saúde
de uma maneira que não acontecia antes. É sustentável? Talvez a
perspectiva de Chávez seja que
sim, com o barril a mais de US$
40. Mas dá oportunidade aos pobres de investir e ter seus próprios
negócios? Não."
Para a especialista, o governo
venezuelano mantém os pobres
como permanentemente dependentes do Estado, o que, a seu ver,
"não é bom para a política nem
para a democracia".
Ela também critica a oposição,
por ter contribuído para a polarização do país, com a tentativa de
golpe em 2002, a greve geral em
seguida e a hostilização do presidente na mídia -controlada majoritariamente por antichavistas.
"Parece bastante, na Venezuela,
com uma luta de classes. Outros
dirão que parece o Chile no início
dos anos 70. Eu estive na Nicarágua nos anos 80, são dois países
completamente diferentes, mas o
tipo de confrontação entre classes
que vi por lá me pareceu estar
acontecendo de novo, com a diferença de que há um butim econômico muito maior em jogo, por
causa do petróleo."
(RAFAEL CARIELLO)
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