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RELÍQUIA MILITAR
Carregamento para o Iêmen traz lembrança da Guerra do Golfo
Velho Scud desafia alta tecnologia
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma década depois de virarem
manchete, os velhos mísseis balísticos Scud voltaram ao noticiário
ao serem descobertos em um suspeito navio norte-coreano a caminho do Iêmen, país que, junto vários outros do Oriente Médio, é
usuário dessa antiga arma da
Guerra Fria. Mas o receio americano de disseminação desses foguetes é compreensível.
Protagonista do primeiro duelo
entre míssil balístico e míssil antimíssil, os Scuds poderão voltar a
ser lançados se os EUA entrarem
em guerra com o Iraque, com resultados imprevisíveis.
Os EUA têm testado Scuds capturados (ou comprados de países
hoje aliados) para conhecer melhor sua configuração de vôo. Um
teste desses, no mês passado, nem
envolveu uma tentativa de interceptação, pois era essencial conseguir antes os parâmetros de vôo
da velha arma de origem comunista.
Os velhos mísseis iraquianos,
talvez com alguma modernização
no seu sistema de orientação, voltariam a ser ameaça para Israel e
para aliados dos EUA, como durante a Guerra do Golfo, em 1991.
Do outro lado figuraria o mesmo míssil antiaéreo americano
Patriot, que em 91 provou ter alguma capacidade antimíssil
-mas bem menos do que foi oficialmente divulgado-, e que
agora está de cara nova, com eletrônica radicalmente renovada.
É portanto impossível prever o
resultado de um novo embate,
por mais irônico que seja, entre a
mais moderna tecnologia aeroespacial americana e um velho míssil soviético dos anos 60 ainda
usado por cerca de 25 países.
Há alguns dias o Departamento
da Defesa dos EUA anunciou que
a produção do Patriot seria aumentada em 16% em 2003 e 2004,
um total de 208 mísseis que se somariam ao arsenal existente.
Os novos mísseis obviamente
não seriam usados em uma guerra próxima contra o Iraque, mas
seriam os substitutos daqueles
que, segundo se prevê, seriam
usados em combate possivelmente no começo de 2003.
A versão do Patriot usada na
Guerra do Golfo era conhecida
como PAC-2. A versão atual,
PAC-3, começou a ser produzida
em setembro de 2001 e continua
em uma fase intermediária, entre
experimental e operacional.
PAC é a sigla em inglês para
"Patriot de capacidade avançada". PAC-1 e PAC-2 foram desenvolvidos para dar ao míssil antiaéreo original alguma capacidade
contra mísseis balísticos.
Na Guerra do Golfo os iraquianos usaram cerca de 90 Scuds, dos
quais 43 confirmados contra alvos na Arábia Saudita (onde se
concentravam as tropas americanas e de seus aliados) e 39 contra
Israel, em uma tentativa de envolver o país no conflito e rachar a
coalizão anti-Iraque, que incluía
vários países islâmicos.
Ironicamente, a maior dificuldade do Patriot de atingir os
Scuds veio da própria obsolescência do míssil, que fazia uma trajetória irregular e podia se desintegrar durante a reentrada na atmosfera baixa.
A Raytheon, fabricante do míssil -a mesma empresa que cuida
do programa Sivam de vigilância
da Amazônia brasileira-, estima
que os Patriot tenham conseguido engajar com eficácia 40% dos
Scuds lançados contra Israel e
70% dos lançados contra alvos na
Arábia Saudita (um dos quais
atingiu um aquartelamento americano, matando 28 pessoas, o
maior "sucesso" dos Scuds). Os
militares americanos fizeram estimativas semelhantes.
Um pesquisador do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), Theodore Postol, fez um estudo independente mostrando as
falhas dos Patriots. Menos de 10%
dos Scuds teriam sido atingidos
diretamente.
Tanto faz, tanto fez, pois durante a guerra os Patriots tiveram
principalmente o papel mais político do que militar de ajudar a impedir Israel de retaliar o Iraque.
Como seria agora, com uma nova
versão ainda não-confiável do
míssil, com Israel sabendo das falhas da versão anterior e com o
óbvio desejo de retaliação que de
novo surgiria?
Israel tem dificuldade em achar
alvos apetitosos na Intifada palestina ou na guerra contra terroristas internacionais. Atacar o Iraque seria portanto de novo
atraente, como foi a destruição
"cirúrgica" do reator nuclear iraquiano de Osirak, em 1981, em
um brilhante ataque aéreo a longa
distância.
As primeiras versões do Patriot
PAC-3 já foram testadas, em geral
com sucesso, contra alvos simulando mísseis balísticos de alcance médio como os Scuds. O programa está agora sendo acelerado. O general americano que chefia a Agência de Defesa contra
Mísseis, Ronald Kadish, declarou
recentemente que o PAC-3 precisa agora ser adquirido o mais rápido possível.
Israel também acelerou seus
programas de defesa antimíssil
depois da guerra de 91. Com ajuda
dos EUA, os militares israelenses
desenvolveram o sistema defensivo Arrow (flecha).
Resta saber, se esse for o caso, se
a tecnologia de defesa contra mísseis do começo do século 21 conseguirá ter sucesso face a um velho míssil da década de 60 do século passado.
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