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Crises domésticas beneficiam grupos islâmicos
DA REDAÇÃO
Há uma tendência na imprensa
e nos meios acadêmicos dos EUA
que busca explicar os desenvolvimentos políticos do mundo islâmico como resultado da reação
dessas sociedades ao Ocidente.
Por essa ótica, o antiamericanismo personificado na figura de
Osama bin Laden seria a principal
razão dos bons resultados eleitorais obtidos recentemente por
partidos islâmicos de países tão
distintos entre si como Paquistão,
Turquia, Bahrein e Marrocos.
A irritação com Washington
-e com os regimes do Oriente
Médio aliados ao país de George
W. Bush- é apenas parte da explicação dos motivos que vêm elevando a popularidade dos movimentos muçulmanos.
O fator doméstico -a desilusão
popular com o fracasso do governo em lidar com crises econômicas e sociais agudas- talvez seja
uma razão mais concreta para o
presente fenômeno.
"A grande maioria dos turcos
votou em [Tayyip" Erdogan não
porque ele apóia posições islâmicas, mas em protesto contra o último governo do premiê Bulent
Ecevit, visto como corrupto", disse William Hale, professor da Escola de Estudos Orientais e Africanos (SOAS) da Universidade de
Londres.
"A maioria votou por razões
pragmáticas e não-religiosas. E
Erdogan precisa prestar atenção à
natureza desse apoio popular",
afirmou Hale.
John L. Esposito, professor de
religião e relações internacionais
da Universidade Georgetown,
também vê a vitória do Partido da
Justiça e do Desenvolvimento
(AKP) sob o prisma da amargura
doméstica.
"[A vitória do AKP" é sinal de
que uma significativa parcela da
população vê seu sistema político
e econômico como fracassado e
está procurando uma alternativa", afirmou.
O mesmo pode ser dito no caso
paquistanês. A coalizão de grupos
islâmicos Muttahida Majlis-I-Amal (MMA) conquistou cerca
de um terço das cadeiras do Parlamento.
O MMA é abertamente contrário à presença de soldados americanos no país e à aliança entre o
ditador Pervez Musharraf e os
EUA.
Contudo sua expressiva votação
representa o repúdio popular às
outras alternativas de poder,
manchadas pela corrupção, caso
dos partidos dos ex-governantes
Nawaz Sharif e Benazir Bhuto, e
pelo autoritarismo, caso de Musharraf.
"A combinação de governo militar consolidado com a falta de alternativas adequadas criou espaço para que os partidos religiosos
obtivessem um mandato muito
maior que aqueles conquistados
em toda a história eleitoral do Paquistão", escreveu Shahnaz Rouse, professora de sociologia do Sarah Lawrence College (EUA).
A desilusão com as condições
de vida e com as características repressivas de seus governos faz dos
movimentos islâmicos a principal
via alternativa a ser adotada pela
população dos países do Oriente
Médio.
Organizações como a Irmandade Muçulmana, no Egito e na Jordânia, o Hizbollah, no Líbano, e o
Hamas, nos territórios palestinos,
conquistam a simpatia dos setores mais desamparados pela burocracia estatal com programas
de assistência social (creches, hospitais, alimentação etc.).
Os principais partidos religiosos
-como é o caso do AKP na Turquia- exploram cada vez mais a
temática da corrupção em busca
de apoio. Mostram-se "virtuosos", seguindo uma ética determinada pela religião, em contraposição aos seus adversários envolvidos em escândalos.
Eles denunciam as elites que governam os seus países por suas relações com o empresariado nacional e estrangeiro. E destacam casos de enriquecimento ilícito
-um dos principais motivos, por
exemplo, de insatisfação na Cisjordânia e na faixa de Gaza com o
líder palestino Iasser Arafat.
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