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CRISE
Para ex-mentor de Chávez e da "revolução bolivariana", governo estimula golpistas ao recusar realização de referendo
Para ex-chavista, só eleição salva Venezuela
ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO
A única saída para a crise política venezuelana é a realização de
eleições, e, ao negar essa possibilidade, o governo comete um suicídio, abrindo caminho a pressões
golpistas. Quem afirma é o ex-ministro do Interior Luis Miquilena,
84, considerado o mentor político
do presidente Hugo Chávez e de
sua "revolução bolivariana" e que
rompeu com ele em janeiro, tornando-se um dos principais chavistas a debandar para a oposição.
"Um regime democrático deve
seguir um caminho democrático,
que é a via eleitoral", disse ele em
entrevista à Folha por telefone, de
Caracas, na noite de quinta-feira.
Miquilena, que, como presidente da Assembléia Constituinte em
1999, ajudou a redigir a nova Carta do país, contesta o argumento
de Chávez contra a realização de
um referendo sobre seu mandato
-de que seria inconstitucional.
"Quando alguém não quer buscar saídas, começa a procurar chicanas que servem para justificar
qualquer coisa", diz. Segundo ele,
as consultas populares são previstas pela Constituição e já foram
feitas em outras ocasiões, quando
interessavam ao governo.
Folha - O diálogo entre o governo
e a oposição pode dar resultados?
Luis Miquilena - Infelizmente
não se vê um espírito verdadeiramente flexível por parte do governo, que é quem tem de ceder. O
governo é o maior interessado em
que o problema seja resolvido.
Folha - Qual seria a solução para a
crise? Eleições?
Miquilena - Não há outro caminho. Um regime democrático deve seguir um caminho democrático, que é a via eleitoral. Uma possibilidade é seguir a proposta da
oposição, de fazer uma consulta,
sem caráter vinculante, mas que
daria uma idéia da posição popular em relação ao governo. Daria
consciência ao governo de que
tem de mudar. Outra possibilidade é adiantar as eleições, uma das
vias exploradas pela mesa de diálogo. Acho que há alguma possibilidade de que o governo ceda
nisso, mas para isso é preciso uma
reforma na Constituição.
Folha - Chávez diz que a Constituição não permite eleições antecipadas nem um referendo sobre seu
mandato antes de agosto. O sr.,
que presidiu a Assembléia Constituinte, defende a realização do referendo. Quem tem razão?
Miquilena - O que existe é um
problema político, não jurídico.
Quando alguém não quer buscar
saídas, começa a procurar chicanas que servem para justificar
qualquer coisa. Em matéria de interpretação das leis, cada um toma o caminho que lhe parece
mais fácil e cômodo para condicionar uma disposição legal a seus
interesses. A Constituição é muito
clara. Tem caminhos muito expressos, em relação a referendos
consultivos. Isso já foi aplicado
para consultar o povo sobre outras questões, como a relegitimação dos dirigentes sindicais.
Folha - É possível Chávez mudar
para se manter no poder?
Miquilena - Acho que as coisas
chegaram a um ponto irreversível
em relação a sua presença no governo. Ele é o centro da disputa.
Não há outra saída para ele a não
ser sua relegitimação eleitoral.
Folha - As pesquisas mostram
que, apesar do rechaço a Chávez
ser majoritário, as divisões na oposição poderiam dar ao presidente
uma vitória eleitoral...
Miquilena - Se muitos opositores
não tomarem consciência de que,
para resolver o problema, será
preciso renunciar a muitos de
seus apetites a protagonismos,
merecem ter qualquer tipo de governo. Mas estou seguro de que as
condições estão colocadas de tal
forma que as pessoas já tomaram
consciência do problema e trabalharão para apresentar um só candidato para enfrentar Chávez.
Folha - A oposição não poderia
esperar até agosto para um referendo, como quer Chávez?
Miquilena - As coisas estão muito complicadas, com o enfrentamento aumentando a cada dia.
Não sei até quando poderia resistir um processo como o atual.
Folha - Pode haver outro golpe?
Miquilena - Tudo é possível nas
atuais condições. Nós democratas
nos opomos completamente a
uma saída de força. A saída democrática é a que está sendo pedida. E por isso é um suicídio para o
governo fechar todas as possibilidades de uma saída democrática
que se colocam sobre a mesa.
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