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Dieta surgida nos EUA que veta alimento cozido cresce agora no Reino Unido; para especialistas, benefício é limitado, mas seus adeptos crêem que organismo humano seja programado para preferir comida crua
O saudável come CRU
SARAH MERSON
DO "INDEPENDENT"
Quem pensa em comida crua
provavelmente conjura imagens
de legumes e frutas sem graça.
Mas, à medida que uma dieta baseada em alimentos crus atinge
seu pico de popularidade nos
EUA, com seguidores como Demi
Moore e Robin Williams e restaurantes de comida crua abrindo de
costa a costa, cada vez mais gente
adere ao cru no Reino Unido.
Enquanto a revista "Get Fresh!"
(algo como "fique fresco") registra uma recente alta em seu número de assinantes, restaurantes
londrinos que seguem o menu
cru vêem a procura por seus pratos crescer. "Servimos comida
crua há dois anos e meio, mas nos
últimos meses a demanda aumentou muito", diz Leon Phong,
gerente do Vita Organica.
Mas o que é, na prática, uma
dieta crua? Os seguidores comem
apenas vegetais não cozidos, evitam carne de qualquer espécie e
alimentos processados e refinados, como laticínios, grãos de cereais, sal e açúcar.
"Pode-se presumir que uma
dieta de comida crua seja limitada, mas não é preciso que seja assim. Idealmente, quem segue
uma dieta crua incorporará uma
ampla variedade de alimentos a
seu cardápio e, ao contrário da
crença popular, não vai comer só
salada. Frutas e legumes, por
exemplo, podem ser combinados
em sucos e vitaminas e, ainda que
métodos tradicionais de cozinha
não sejam adotados, os alimentos
podem ser preparados em um desidratador, equipamento que circula ar quente a fim de secar os
alimentos, em lugar de cozinhá-los. Usando esse método, podemos fazer coisas como pizza crua
e macarrão cru", disse Phong.
Os defensores da dieta crua
apontam para nossos ancestrais e
argumentam que não evoluímos
para comer alimentos cozidos.
Também dizem que nenhuma
outra criatura do planeta o faz, e
que nossos corpos o reconhecem
como o alimento preferencial
-ao contrário dos cozidos, que,
dizem eles, contrariam nossa formação genética.
Já nos anos 30, um estudo do
Instituto de Química Clínica de
Lausanne (Suíça) demonstrava
que um corpo reconhece alimentos cozidos como invasores perigosos e emprega um processo conhecido como leucocitose digestiva, sob o qual múltiplos glóbulos
brancos correm para a boca ou o
estômago na tentativa de eliminar
o intruso. "O problema quanto a
isso", diz Gina Shaw, especialista
em saúde e nutrição, "é que,
quando o mecanismo de defesa é
deflagrado três ou mais vezes por
dia, o resto do corpo fica sem defesa, e o sistema imunológico sofre desgaste considerável."
Mas existe alguma prova clara
de que a comida crua nos faz
bem? Os adeptos da dieta citam
uma série de vantagens, de um ganho de energia à maior resistência
a resfriados e gripes, passando
por uma pele mais saudável e cabelo mais brilhante. Isso, dizem
eles, se deve em larga medida ao
fato de que os alimentos que comem continuam ricos em nutrientes, já que não há destruição
de vitaminas e minerais durante o
processo de cozimento.
Além disso, os vegetais crus
contêm compostos como os carotenóides, os flavonóides e os picnogenóis, que, segundo diversas
pesquisas, têm propriedades benéficas à saúde.
Outro aspecto saudável da dieta
de comida crua é a preservação de
enzimas. "As enzimas ajudam o
corpo humano a digerir alimentos e agem como catalisadores para todas as reações metabólicas do
corpo. Sem elas, não pode haver
divisão celular, produção de energia ou atividade cerebral. Nenhuma vitamina ou hormônio pode
cumprir seu papel, e o mesmo se
aplica ao sistema imunológico",
diz Roxanne Klein, especialista
em preparar alimentos crus e co-autora do livro "Raw" (cru).
Sabemos, no entanto, que cozinhar alimentos destrói as enzimas
naturais, forçando nossos corpos
a gerar o suficiente para digerir a
comida. De acordo com Klein, isso causa problemas: "O corpo não
é capaz de produzir enzimas em
combinações perfeitas para metabolizar alimentos de maneira tão
completa quanto seria o caso das
enzimas naturais. Isso resulta em
gorduras, proteínas e amidos digeridos de maneira imperfeita,
que podem obstruir o aparelho
intestinal e as artérias".
IDÉIA DESANIMADORA
Para muita gente a idéia de comer só alimentos crus é desanimadora. Há o aspecto social, por
exemplo -jantar fora pode se
tornar tedioso ou impossível.
Mas a dieta pode ter ainda outros problemas, e mais sérios.
"Comer só comida crua pode limitar a variedade dos alimentos
consumidos, o que gera um desequilíbrio de nutrientes. Por exemplo, os carboidratos que contêm
muito amido, como arroz, massas, pão e batatas, fornecem fibras
insolúveis, em contraste com as
fibras solúveis fornecidas por frutas e legumes; além disso, vitaminas B necessárias aos nossos percursos metabólicos podem não
estar disponíveis", disse Sarah
Schenker, da Fundação Britânica
para a Nutrição.
Embora os adeptos da dieta
acreditem que o cozimento destrua os nutrientes, Schenker destaca um estudo recente do Instituto de Pesquisa Alimentícia de
Norwich segundo o qual "cozinhar cenouras na verdade libera
mais carotenóides antioxidantes
presentes no legume, e isso permite que sejam absorvidos pelo
corpo de maneira melhor".
"É igualmente improvável que
os adeptos da dieta crua recebam
proteína suficiente, já que eles evitam carne, peixes e grãos que necessitem cozimento", diz Schenker. Embora seja provável que a
pessoa se sinta bem por um tempo, ante a insuficiência de proteínas o corpo começa a usar suas
reservas, e a saúde se deteriora.
De acordo com os defensores da
dieta, no entanto, a comida crua
pode incorporar "superalimentos" como os brotos ou a grama-de-ponta, que compensariam essas deficiências de nutrição.
"Os brotos são plantas recém-nascidas", diz Steve Meyerowitz,
especialista em brotos e grama-de-ponta. "Nesse estágio de seu
crescimento, dispõem de maior
concentração de vitaminas, proteínas e minerais, enzimas, bioflavonóides e assim por diante, do
que em qualquer momento posterior de seus ciclos, e esses nutrientes existem em forma elementar, o que facilita a sua digestão." Um suco de grama-de-ponta serve como complemento único, pois, além de enzimas e aminoácidos, dispõe de todas as vitaminas do grupo B e mais as vitaminas A, C, E e K, além de conter
cálcio, magnésio, manganês, fósforo, potássio, zinco e selênio.
"A grama-de-ponta dá ao corpo
toda a matéria-prima para produzir o material necessário e equilibrar a química", diz Meyerowitz.
Falta de vitamina B12
Há, no entanto, um elo perdido
na dieta crua: a vitamina B12
-encontrada em carne, peixes,
ovos e leite, necessária à formação
de glóbulos vermelhos e de sistemas nervosos e cardiovasculares
saudáveis. Segundo o nutricionista Gabriel Cousins, é aconselhável
que os adeptos da dieta usem suplementos da vitamina em injeções ou alta dosagem oral.
Outro problema é a possibilidade de desenvolver deficiências de
ácidos gordurosos essenciais
(AGE), que o corpo não produz
sozinho. É o caso do Ácido Gama-Linolênico (GLA), importante para a redução do colesterol, reforço
do sistema imunológico e prevenção de problemas de pele. Para
agravar a situação, muitos dos
adeptos consomem quantidade
exagerada de alimentos açucarados, inibindo a conversão de ácido linoleico em GLA.
Embora a maior parte dos alimentos crus esteja repleta de fibras, enzimas e nutrientes, os
adeptos da comida crua deveriam
estar conscientes de que o açúcar
das frutas pode neutralizar essas
propriedades ao desregular o nível de açúcar do sangue. Além
disso, muita gente gosta de fazer
suco das frutas e dos legumes, o
que remove as fibras que retardam a liberação de açúcares na
corrente sangüínea. É melhor,
portanto, beber sucos de verduras, que não contêm tanto açúcar.
O suco de verdura também sustenta a manutenção de um pH ligeiramente alcalino no corpo, o
que, de acordo com Robert
Young, autor de "The pH Miracle", é a coisa mais importante para a manutenção da saúde.
A maioria das pessoas, no entanto, registra alta acidez. Como
conseqüência, funções corpóreas,
do batimento cardíaco ao disparo
dos neurônios, são interrompidas; se o processo não for controlado, tecidos corporais começam
a se decompor.
Segundo Young, a maneira de
contrabalançar esses problemas
de saúde é comer a combinação
certa de alimentos que formam
ácidos e alcalinos. Isso significa
que 80% de nossa dieta deveria
consistir de alimentos alcalinizantes, como verduras, deixando
uma porção muito menor de comidas acidificantes, como a carne
ou os cereais, no prato.
Os adeptos da comida crua começam em vantagem quanto a isso. "Eles têm um sangue muito
claro, com um pH ligeiramente
alcalino e baixo volume de fermentação", diz Catherine Daly,
especialista em microscopia da
nutrição. Mas nem todos têm, necessariamente, um sangue saudável. "De fato, as pessoas adeptas
do cru podem também ter problemas de saúde. É importante que
elas saibam o que fazem."
"Não é aconselhável que as pessoas comam apenas alimentos
crus por um período prolongado", acrescenta Leslie Kenton,
que ajudou a promover a revolução da comida crua em seu mais
recente livro, "The Powerhouse
Diet". "Mas uma dieta contendo
apenas alimentos crus pode ser
ótima em períodos curtos, especialmente se você está se tratando
de um problema como câncer,
Aids ou depressão."
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