São Paulo, quarta-feira, 20 de agosto de 2008

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Rival de presidente critica papel de Lula em referendo revogatório

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A SANTANDER

A oposição boliviana se contém, mas não esconde a decepção com o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, pelo apoio dado a seu colega Evo Morales, durante a campanha para o chamado referendo revogatório.
"Não era o melhor comportamento", diz Jorge Quiroga, ex-presidente (2001/02), hoje líder do conservador Podemos, em alusão ao fato de Lula ter comparecido em julho a um ato com Morales no departamento de Beni, cujo governante (Ernesto Suárez) é um dos que querem a autonomia e faz oposição a Morales.
"Seria o mesmo que um presidente de país vizinho comparecer a um ato, por exemplo, no Rio Grande do Sul, ao lado do presidente Lula, se ele estivesse em confronto com o governador gaúcho", compara Quiroga.
Mas a crítica a Lula é matizada. O ex-presidente prefere centrar seu ataque em Morales e, em especial, no venezuelano Hugo Chávez, que também compareceu ao ato em Beni: "A ingerência obscena é de Chávez. Os demais presidentes [da região] mantêm-se em cânones mais ou menos respeitosos".
Para Quiroga, Chávez usou Lula como uma espécie de escudo para poder comparecer ao comício pró-Morales. "Ele já não se anima a vir sozinho", acredita o ex-presidente, para quem o repúdio ao líder venezuelano é muito forte na Bolívia. Pelo menos no departamento de Beni, deve ser mesmo, porque Evo Morales teve apenas 43,7% dos votos no referendo revogatório de duas semanas atrás (no país todo, ficou com mais de dois terços).
Quiroga acha que o resultado do referendo -que confirmou nos cargos tanto Morales quanto todos os principais governadores oposicionistas- "não muda nada" na política boliviana. Como é natural em um líder oposicionista, minimiza a importância política de o presidente ter obtido mais votos no referendo do que na eleição presidencial de 2005 (na qual, aliás, Quiroga foi derrotado).
"No referendo, o eleitor escolhia apenas se queria que o presidente e os governadores saíssem ou ficassem. Não é comparável com as votações anteriores", diz Quiroga.

Constituição
Para ele, o que conta de fato no cenário político boliviano é a nova Constituição, cujo texto foi aprovado em polêmica sessão realizada em um quartel e só com parlamentares da situação. Agora, terá que ser submetida a referendo. "O decisivo é saber se Morales pode impor sua Constituição ou se se chegará a um pacto nacional por uma Constituição para todos."
Quiroga acha "muito difícil" que o governo tenha tempo e apoio regional para aprovar a Constituição já elaborada.
Compara com a situação no Equador, país em que o processo de reelaboração constitucional começou 16 meses depois de idêntico movimento na Bolívia e onde já está convocado (para 28 de setembro) o referendo para aprová-la ou rejeitá-la. Na Bolívia, sempre segundo Quiroga, dificilmente o governo encontrará brecha legal para levar a votação a nova Carta antes de dezembro de 2010.
O ex-presidente, cujo partido está ameaçado de ilegalização por não ter apresentado suficiente número de assinaturas de apoio, nega, como também era previsível, que os governadores departamentais tenham se tornado o principal eixo de oposição a Morales, atropelando os partidos tradicionais.
Para Quiroga, o relevo que os governadores obtiveram nos meses mais recentes se deve ao fato de que estavam com seus cargos em jogo, no referendo revogatório. Daqui para a frente, acredita que a política voltará a seu trilho natural, que são os partidos e o Congresso.


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