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Agora, mídia árabe não poderá ignorar evento
DA REPORTAGEM LOCAL
O julgamento de Saddam Hussein por um tribunal iraquiano terá uma magnitude jornalística
inédita no mundo árabe. Por mais
que os países árabes do Oriente
Médio censurem a imprensa e
proíbam temas delicados, será
desta vez impossível evitar que a
internet e as TVs por satélite ofereçam um espetáculo singular.
É a previsão de Muna Nashashibi, dirigente do Arab Media
Watch (observatório da mídia
árabe), entidade pró-árabe baseada em Londres.
A seu ver, é possível um julgamento a portas fechadas, sem a
possibilidade de transmissão ao
vivo de depoimentos. Mas, se for
essa a decisão, o governo norte-americano estaria perdendo uma
oportunidade excepcional de detalhar diante das câmeras os crimes do ditador deposto.
Arbítrio e violência
Nashashibi diz não acreditar
que árabes de outros países associem a ditadura de Saddam a seus
próprios governantes. Há segundo ela uma consciência muito nítida de que Saddam e o Iraque
sempre foram casos de arbítrio e
violência muito excepcionais.
Seu otimismo não é compartilhado por outra instituição que
acompanha a mídia árabe, a Middle East Media Research Institute
(instituto de pesquisa da mídia no
Oriente Médio), de orientação liberal e baseada em Washington.
"A tragédia com a mídia árabe
está no fato de ela ter apoiado
Saddam, mesmo quando ele já estava deposto, só porque ele se tornou um símbolo anti-EUA e anti-Ocidente", diz Yigal Carmon, presidente da entidade.
Quando começaram a ser localizadas, partir de abril, as valas comuns em que os partidários de
Saddam sepultavam milhares de
seus dissidentes, o fato foi bem
pouco noticiado nos países árabes
pelos jornais e emissoras.
Foram exceção à regra a mídia
do Kuait, dos Emirados Árabes e a
saudita impressa em Londres. Foi
também o caso da Al Jazira, uma
das TVs árabes por satélite. E
mesmo assim discretamente, depois que a CNN e a BBC, suas concorrentes regionais, já haviam dedicado ao tema amplas reportagens.
A Al Arabiya, outra TV por satélite, nada noticiou. O mesmo vale
para os jornais do Egito, do Líbano e da Síria.
"Chauvinismo nacionalista"
"Foi uma expressão do apoio
camuflado a Saddam e da predisposição de perdoá-lo por seus crimes, só porque ele se opõe agora
aos Estados Unidos e virou a expressão de um chauvinismo nacionalista", diz Carmon.
A seu ver a questão da descoberta de valas comuns está estreitamente ligada à forma pela qual os
árabes cobrirão o julgamento do
ex-ditador, que passa a reunir os
ingredientes políticos para se
transformar em "herói".
Assim, o julgamento servirá como um divisor de águas no Oriente Médio. Na avaliação de Carmon, "será possível saber quem é
a favor de Saddam e quem defende valores democráticos e humanitários".
(JBN)
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