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ELEIÇÕES
Disputa entre o chanceler Schröder (centro-esquerda) e o conservador Stoiber é a mais acirrada desde os anos 80
Sem favorito, Alemanha vai hoje às urnas
MÁRCIO SENNE DE MORAES
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM
Necessitando urgentemente de
reformas estruturais para dinamizar sua economia, dividida quanto à posição do chanceler (premiê) social-democrata Gerhard
Schröder, que busca a reeleição,
sobre um possível ataque ao Iraque para depor o ditador Saddam
Hussein e lutando para deter a
onda de centro-direita e de direita
que toma conta da Europa recentemente, a Alemanha vai às urnas
hoje sem favorito.
Há duas décadas, o país não tinha uma disputa tão acirrada pela
Chancelaria. Edmund Stoiber,
candidato pela aliança conservadora formada pela União Democrata Cristã (CDU) e pela União
Social Cristã (CSU), parecia ter a
eleição definida a seu favor até o
início de agosto, tirando proveito,
entre outros fatores, do fraco balanço econômico da atual administração, que não conseguiu reduzir o número de desempregados para 3,5 milhões -conforme
prometeu Schröder em 1998.
Todavia, um "fato novo" deu
novo alento ao Partido Social-Democrata. Analistas ouvidos pela
Folha foram unânimes em dizer
que a catástrofe ambiental causada pelas inundações que atingiram sobretudo o leste do país foi
um ponto de inflexão na campanha, embora ressaltem que outros
fatores favoreceram Schröder.
"Como chefe de governo, ele se
encontrava na posição ideal para
tirar proveito político do ocorrido, pois podia liberar verbas e
mostrar liderança na administração da crise. E o modo como ele o
fez foi muito bem-visto pela população", analisou Manfred
Nitsch, professor na Universidade
Livre de Berlim. "Contudo isso
não seria suficiente para explicar a
mudança de tendência observada
nas últimas semanas. Inúmeros
fatores contribuíram para a volta
do SPD à disputa, como a perda
de força do PDS [Partido do Socialismo Democrático" após a saída de seu principal expoente, Gregor Gysi, do governo de Berlim, o
que enfraqueceu o partido no leste, e a personalização da campanha, já que o chanceler é mais
"simpático" que seu oponente."
Stoiber, governador da abastada Baviera, apostava tudo no balanço econômico de seu Estado
para conquistar o eleitorado, cuja
maior preocupação, de acordo
com pesquisas recentes, continua
sendo o desemprego -que atinge pouco mais de 4 milhões de
pessoas, quase 10% da população
ativa do país. Afinal, o balanço
econômico da administração de
Schröder não foi dos melhores.
Exceto em 2000, quando cresceu
mais de 3%, a economia alemã
patina há mais de uma década.
"É verdade que ele herdou o Reformstau [congestionamento de
reformas" do ex-chanceler Helmut Kohl [CDU", mas não fez o
suficiente para dinamizar a economia do país. Não introduziu as
cruciais reformas do mercado de
trabalho, dificultando a retomada
do crescimento econômico e a redução do desemprego. Seu maior
feito nessa área foi a redução do
Imposto de Renda, parte da reforma fiscal", disse Carsten-Patrick
Meier, do Instituto para Economia Mundial de Kiel.
Há duas semanas, quando a onda de popularidade conseguida
com as inundações começou a enfraquecer, Schröder, que, anteriormente, já tinha dado uma guinada à esquerda em busca de assegurar os votos dos mais fiéis
eleitores do SPD, soube tirar proveito da situação política internacional e, durante um debate na
TV, sustentou que, sob seu comando, a Alemanha não participaria de um ataque ao Iraque. Segundo pesquisas, mais de 70%
dos alemães são contrários à participação alemã numa guerra.
"O chanceler foi acusado de
oportunismo político por seus adversários, o que pode até ser verdade. Mas sua determinação em
não aceitar uma ação militar contra Saddam Hussein, independentemente da anuência da ONU,
lhe rendeu a manutenção da tendência favorável nas pesquisas recentes", explicou Gerhard Göhler,
da Universidade Livre de Berlim.
Percebendo que, se não tomasse
uma atitude drástica, sua aliança
conservadora seria derrotada,
Stoiber deixou o discurso consensual "de centro" e partiu em busca
do eleitorado eminentemente de
direita, abordando o delicado tema da imigração. "Só após o escrutínio saberemos se sua mudança de estratégia foi correta. A
imigração e a presença de estrangeiros são temas bastante delicados na Alemanha, pois polarizam
a população", indicou Nitsch.
Os vizinhos europeus da Alemanha assistem atentamente à
acirrada disputa, pois há pequenas -mas sensíveis- diferenças
entre os dois candidatos no que se
refere à União Européia. "Com
Stoiber, políticas mais liberais deverão ganhar força no bloco. E,
como a expansão da UE deverá
ocorrer no final deste ano, os candidatos à adesão devem observar
de perto o que ocorre na Alemanha atualmente", disse Joaquín
Roy, especialista em UE da Universidade de Miami.
Indubitavelmente, o pleito de
hoje é decisivo, pois, como maior
país do bloco europeu e terceira
mais poderosa economia do planeta, a Alemanha tem influência
direta na cena político-econômica
mundial. Porém, como ressaltaram os analistas, nenhuma mudança drástica deve ser esperada.
O jornalista Márcio Senne de Moraes
viajou a convite do Escritório Federal de
Imprensa da Alemanha
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