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A NOVA GEOPOLÍTICA
Com orçamento militar recorde, EUA adotam unilateralismo e se posicionam para a nova fase da competição econômica global
Petróleo e terror movem poderio bélico
DE WASHINGTON
EM LINHA COM A GUERRA ao terror e com suas
ambições geopolíticas, o governo George W. Bush promoveu a maior reorganização e modernização das tropas militares americanas dos últimos 50 anos. No início
do seu governo, Bush prometeu manter a força militar
americana ""acima de todos os desafios, tornando qualquer corrida armamentista de tempos passados totalmente inútil".
Depois do 11 de Setembro, Bush
anunciou que essa mesma força
"acima de todos os desafios" se
arrogava o direito de atacar outros países preventivamente, caso
se sentisse intimidada.
O governo Bush vê o ""resultado
positivo" dessa ameaça no ditador líbio, Muammar Gaddafi, que
abandonou seu programa de armas e decidiu abrir o país a investimentos americanos. Mas lá onde realmente mora o perigo, segundo os EUA, tal política provocou apenas o efeito inverso.
No mundo árabe, líderes que
possam parecer alinhados com os
EUA tornaram-se ainda mais impopulares como resultado da invasão americana no Iraque.
Nos outros dois integrantes do
chamado ""eixo do mal" (Coréia
do Norte e Irã), a mensagem dos
"ataques preventivos" pode ter levado a uma aceleração também
"preventiva" de projetos nucleares capitaneados por seus líderes.
Como reforço à atual política,
tanto Bush quanto John Kerry
afirmaram na campanha eleitoral
que os EUA não se submeterão a
nenhuma instituição internacional para tomar medidas bélicas
que considerem necessárias.
O descaso com a ONU e com a
Otan (Organização do Tratado do
Atlântico Norte) é exacerbado
ainda por orçamentos militares
recordes no governo Bush e por
uma movimentação de tropas pelo mundo ainda não totalmente
compreendida. O resultado é que
todo um conjunto de alianças militares construídas ao longo dos
últimos 50 anos estremeceu nos
anos Bush. A magra coalizão militar no Iraque é a prova disso.
Há pouco mais de duas semanas, os EUA aprovaram um novo
orçamento militar de US$ 422 bilhões para 2005, visando a modernização e o deslocamento de suas
tropas pelo globo. Como Bush,
Kerry promete manter os investimentos militares nos mesmos níveis atuais, aumentar em cerca de
40 mil homens a força ativa e continuar a atual reorganização.
Nos últimos dois anos, cerca de
70 mil militares americanos estacionados em bases tradicionais na
Europa, Ásia e Arábia Saudita começaram a ser transferidos para
atender às novas diretrizes.
Geopoliticamente, ganharam
predominância na Ásia e ao sul da
China países como Filipinas, Malásia e Cingapura; na África e a
oeste da Arábia Saudita, o minúsculo africano Djibuti; e ao sul da
Rússia e oeste da China, o Cazaquistão e o Uzbequistão, próximos às reservas petrolíferas do
mar Cáspio. No centro do Oriente
Médio, os EUA têm outros 120 mil
homens no Iraque, além de 18 mil
no Afeganistão. Entre os dois países, está o Irã. Logo abaixo, o pequeno Qatar também vem recebendo novos contingentes.
Michael O'Hanlon, analista do
Instituto Brookings, afirma que a
justificativa da guerra ao terror facilitou o deslocamento das tropas
americanas para todas essas regiões, que atendem, na verdade, a
objetivos geopolíticos.
Além de terroristas, os EUA estariam perseguindo a manutenção e a estabilidade de reservas,
principalmente de petróleo, para
uma nova fase, já em andamento,
da competição econômica global.
Em 2004, por exemplo, 40% do
aumento da demanda mundial
por petróleo terá como origem a
China, segundo dados do FMI.
Em dez anos, os chineses poderão
estar totalmente dependentes do
petróleo da Arábia Saudita e da
região do mar Cáspio.
Para Kenneth Pollack, ex-membro do Conselho Nacional de Segurança e especialista em Oriente
Médio, os EUA crêem ter ""legítimo interesse" na região. A razão
seria o fato de toda a economia
mundial e americana estar baseada em petróleo barato. O fato de
um litro de gasolina custar nos
EUA menos do que em um país
pobre como o Brasil (R$ 1,56 contra R$ 2,14) é um exemplo disso.
""O fato de os EUA não importarem a maior parte do seu óleo da
Arábia Saudita é irrelevante", diz
Pollack, já que problemas de fornecimento no país teriam impacto global nos preços. ""Daí a preocupação em assegurar a região."
Cerca de 25% do petróleo consumido hoje no mundo sai do
Golfo Pérsico, sendo 15% da Arábia Saudita. Além de ter as maiores reservas, o país produz seu petróleo a 30% do custo do da Rússia, por exemplo. De seu comércio
com a África, no ano passado,
85% das importações dos EUA foram em petróleo. As exportações
tiveram percentual semelhante
em máquinas para extração do
óleo. (FERNANDO CANZIAN)
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