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Grupos de moradores criam restaurantes populares
DE BUENOS AIRES
"Deixamos de ser a cidade dos
cafés para ser a cidade dos "cartoneros" e dos "comedores'", diz
Martha Juarez, 56, criadora de um
restaurante popular e dirigente da
assembléia dos moradores do
bairro de San Telmo, na região
central de Buenos Aires.
Os "comedores" são restaurantes populares, onde se come pagando muito pouco ou de graça.
Os "cartoneros" são desempregados que, nos últimos anos, começaram a percorrer as ruas da cidade durante toda a noite recolhendo papel e papelão.
Não existem estimativas oficiais, mas os "comedores" multiplicaram-se na Argentina. Com
mais da metade da população desempregada ou subempregada, a
procura pelos restaurantes explodiu. O governo abriu restaurantes
populares. Há escolas que atendem à população. Organizações
não-governamentais dirigem
centenas de centros de alimentação. Só a Caritas Argentina tem
cerca de 5.000 que alimentam,
atualmente, mais de 600 mil pessoas -eram 300 mil há dois anos.
Em alguns casos, como o de
Martha, os próprios moradores
de uma região criam restaurantes.
Na assembléia dirigida por Martha há um cadastro de desempregados e reuniões semanais para
encontrar algum tipo de trabalho
para as pessoas que recorrem ao
restaurante. Há comida durante o
dia para cerca de cem pessoas, e,
durante a noite, para 35 "cartoneros" que recolhem papel no bairro. "Pedimos ao governo para
criar um restaurante no bairro.
Mas parece que há áreas mais
prioritárias, com casos mais sérios. Então fizemos nós mesmos",
diz Martha.
"Cartoneros"
Segundo o Indec (o órgão oficial
de estatística), há 155 mil "cartoneros" na Argentina. Apenas em
Buenos Aires, cerca de 40 mil pessoas trabalham durante a noite
recolhendo papel.
Francisco Rodríguez, 28, percorre todos os dias cerca de 15 km
em busca de papel. Diz conseguir
ganhar dez pesos por noite (cerca
de R$ 10). Rodríguez estudou dez
anos e lê os jornais argentinos
-que recolhe nas ruas- todas as
manhãs. Sabe um pouco de história do Brasil e de economia, diz esperar que o Mercosul resolva parte dos problemas econômicos argentinos e quer saber sobre o programa de governo de Luiz Inácio
Lula da Silva porque, "talvez no
Brasil, com a liberação da imigração, haja empregos melhores do
que o de "cartonero'".
Ele recolhe papéis na região
central de Buenos Aires. Gasta
dois pesos para pagar pelo transporte do papel e outros 10,5 pesos
mensais para poder tomar, todos
os dias, o "trem dos "cartoneros'",
composições que saem todas as
manhãs e que transportam os
"cartoneros" e seus carrinhos de
papelão para as regiões periféricas
da Grande Buenos Aires, onde a
maioria vive.
Economia do papel
O governo da cidade de Buenos
Aires estima que a economia dos
"cartoneros" movimente cerca de
150 milhões de pesos anuais. Dinheiro que vai para o bolso dos
próprios "cartoneros", de alguns
pequenos restaurantes populares
que vendem comida barata durante toda a madrugada e da centena de mulheres que vendem café e chá-mate aos "cartoneros".
"Eles são a personificação da
crise argentina. Um exército que
deveria estar trabalhando formalmente ou estudando", afirma
Victor Abramovich, diretor-executivo do Cels (Centro de Estudos
Legais e Sociais).
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