|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
EUA
Paraíso de dirigentes criminosos, Estado resolve reagir, mas críticos dizem que falta combater americanos que facilitam os negócios
Flórida caça corruptos latino-americanos
MICHAEL CHRISTIE
DA REUTERS, EM MIAMI
Líderes latino-americanos corruptos que, há décadas, vêm defraudando seus países e guardando o dinheiro público roubado
em apartamentos e bancos da
Flórida estão começando a ser recebidos com frieza em Miami,
apesar do clima quente da cidade.
Uma nova força-tarefa do Serviço de Imigração e Alfândega
(ICE), criada para buscar o dinheiro ilegal de funcionários estrangeiros, dentro da campanha
de endurecimento contra o "dinheiro quente" movida por Washington na esteira do 11 de Setembro, investiga até 20 casos de corrupção envolvendo oito países.
Composta de 18 agentes, a força-tarefa já marcou um tento importante: em dezembro passado,
tomou de Byron Jerez, o "barão"
da Receita da Nicarágua, um
apartamento de US$ 3,5 milhões
na comunidade elegante de Key
Biscayne, em Miami, além de US$
150 mil em dinheiro.
O caso levou a acusações de corrupção contra o ex-presidente Arnoldo Alemán (1997-2002), conhecido como ""Gordo" por seu
físico e seu estilo de vida. Em março, Alemán foi levado preso à Nicarágua pela apropriação indébita
de até US$ 100 milhões.
"Acredito que o caso Jerez seja
apenas a ponta do iceberg", disse
Richard Kolbusz, agente especial
assistente encarregado da força-tarefa sobre corrupção financeira
estrangeira, que tem seu QG no
escritório do ICE em Miami.
Kolbusz, veterano do serviço de
alfândega dos EUA, contou que,
enquanto investigava Jerez, a unidade começou a investigar também o ex-presidente da Guatemala Alfonso Portillo (2000-2004).
Segundo fontes do Judiciário, o
caso Portillo inclui transferências
de fundos por meio de empresas
de fachada e pode ter envolvido
até US$ 250 milhões.
O advogado de Jerez em Miami,
Michael Diaz, disse que os casos
de Alemán e Portillo estão interligados. Ambos envolvem as mesmas empresas panamenhas de fachada e os mesmos laranjas que,
segundo Diaz, parecem ter dirigido "um serviço de corrupção terceirizada".
Kolbusz não quis identificar outros suspeitos que estão na mira
da força-tarefa, mas afirmou que
sete dos oito países envolvidos são
latino-americanos. Outras fontes
bem informadas disseram que já
foram iniciadas as investigações
sobre o rombo de US$ 2 bilhões
de um dos maiores bancos da República Dominicana, o Baninter,
e sobre as atividades de funcionários governamentais do Equador,
do Peru e de Honduras.
Desde sua criação oficial, em
agosto passado, a força-tarefa de
Miami vem fazendo tanto sucesso
junto ao novo Departamento de
Segurança Nacional que o ICE
pretende criar unidades investigativas semelhantes em Nova
York e Los Angeles.
Especialistas em lavagem de dinheiro disseram que Miami é o
lugar perfeito para iniciar o trabalho de investigação. "Esta é a cidade da corrupção", disse Charlie
Intriago, editor do periódico
"Money Laundering Alert".
"Existem bilhões de dólares em
imóveis e contas bancárias no sul
da Flórida pertencentes a líderes
estrangeiros corruptos, atuais ou
passados, civis, militares, seus familiares e associados próximos,
incluindo amantes, namoradas e
namorados."
Críticos dizem que, enquanto
atacam os paraísos fiscais do Caribe por manter o sigilo bancário
que facilita a lavagem de dinheiro,
os EUA têm demorado a reagir
aos bilhões de dólares de dinheiro
sujo que atravessam seu próprio
sistema bancário.
Tudo isso mudou com o 11 de
Setembro, que foi acompanhado
pela consciência de que os terroristas têm tanta tendência a fazer
uso dos pontos fracos na regulamentação e na monitoração bancárias para financiar ataques
quanto traficantes de drogas fazem para lavar seu dinheiro.
A repressão na Califórnia foi
possibilitada pela implantação de
novas medidas decorrentes da lei
USA Patriot, que tornaram a corrupção de estrangeiros um crime
passível de punição sob a legislação americana, nos casos em que
o dinheiro passa pelos EUA em
seu processo de lavagem.
Kolbusz disse que dinheiro vivo
ou outros ativos apreendidos serão devolvidos a seus países de
origem -em muitos casos países
que figuram entre os mais pobres
do mundo-, onde "bom uso poderá ser feito dele". ""Para nós, a
questão principal é reprimir a
corrupção e também enviar uma
mensagem aos outros países: a de
que os EUA estão aqui para ajudar", disse ele. "Enviamos aos futuros ocupantes de altos cargos a
mensagem de que eles não podem mais agir com impunidade.
Eles não têm onde se esconder."
Para reforçar sua campanha
contra a corrupção estrangeira, os
EUA estão cancelando vistos, privando autoridades latino-americanas de suas viagens para fazer
compras em Miami.
Além disso, a representação do
ICE na Flórida concentra os esforços para localizar e deportar dezenas de acusados de abusos dos direitos humanos que buscaram
abrigo nos EUA. Quase 60 foram
expulsos da Flórida nos últimos
anos, incluindo integrantes de esquadrões da morte haitianos.
Especialistas têm dúvidas quanto ao alcance das medidas.
Para Eduardo Gamarra, diretor
do Centro Latino-Americano e
Caribenho da Universidade Internacional da Flórida, se o combate
à corrupção fosse levado a sério,
"seria preciso indiciar 80% de Key
Biscayne e 60% de Coral Gables".
Intriago disse que perseguir autoridades estrangeiras corruptas é
"uma proposta nobre". Mas, em
sua opinião, ela talvez não impeça
que o dinheiro roubado, depois
de devolvido a seus países de origem, seja roubado novamente
-a não ser que as autoridades
americanas também fossem atrás
dos bancos, advogados, contadores e corretores imobiliários de
Miami que possibilitam e facilitam a lavagem de dinheiro.
Tradução de Clara Allain
Texto Anterior: Iraque ocupado: Ataques matam 7 dos EUA e dezenas de civis Próximo Texto: Dueto: Beth Carvalho canta "zamba" para Chávez Índice
|