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25 de Abril lançou bases atuais, diz pesquisador
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um dos desdobramentos da Revolução dos Cravos foi a solução
de um impasse histórico nas elites
locais. Elas hesitavam entre a integração à Europa e a adesão a um
projeto civilizador, que poderia
ser tanto colonial quanto o de
construção de uma comunidade
internacional de língua portuguesa. Ganharam os representantes
da tradição liberal e republicana
que optavam pela Europa. É essa
uma das teses de Lincoln Secco,
34, professor de história na USP e
autor de "A Revolução dos Cravos" (São Paulo, Alameda, 294
págs.). Leia a seguir trechos de sua
entrevista à Folha.
Folha - Como entender que um
Exército dê um golpe de esquerda?
Lincoln Secco - O Exército português só resolve dar um golpe contra o regime, de extrema direita,
porque este ameaçava alguns de
seus princípios fundamentais: a
hierarquia, a disciplina e, fundamentalmente, o prestígio que estava sendo corroído pela guerra
colonial.
Folha - Isso também não ocorreu
em razão do peso do Partido Comunista dentro das Forças Armadas?
Secco - Creio que esse peso tenha sido superestimado. Só depois da Revolução dos Cravos é
que os comunistas passam a ter
uma importância maior.
Folha - Como estavam as elites
políticas portuguesas às vésperas
do 25 de Abril?
Secco - Elas se dividiam em duas
grandes tendências. De um lado,
o setor republicano e liberal defendia a chamada "volta à Europa", e os setores mais à direita defendiam a missão original, imperialista e "civilizadora" de Portugal. A revolução do 25 de Abril resolveu esse problema. Portugal
escolheu a Europa.
Folha - Há seqüelas no fato de o
"europeísmo" ter levado a melhor?
Secco - Portugal vive uma crise.
Na Europa ele é apenas a cauda
política de um processo de integração. Há uma nostalgia do velho império.
Folha - O bem-estar econômico
permitido pela União Européia não
neutraliza essa espécie de claustrofobia própria a um país pequeno?
Secco - Por um lado, sim. Mas há
também as sobrevivências históricas, há também o trauma de um
povo acostumado a uma missão
imperial. E hoje os centros de decisão da Europa estão em Berlim
ou em Paris, e não em Lisboa.
Folha - Mas Portugal não encontrou sua especificidade na UE, como centro de captação de recursos
para investimentos globais?
Secco - Eu acrescentaria também o turismo, que tem um impacto maior na consciência da
população. A integração à Europa
foi o produto final do 25 de Abril.
Mas a produção industrial portuguesa permanece limitada.
Folha - Como entender que Portugal passe de exportador a importador de mão-de-obra?
Secco - Foi uma das mudanças
essenciais trazidas pelo 25 de
Abril. Portugal foi sempre um
país caracterizado pelo que os historiadores chamavam de "constante fuga das gentes". Os portugueses emigram desde os grandes
descobrimentos. Agora o fluxo se
inverte. Portugal recebe brasileiros, africanos, ucranianos.
Folha - Portugal hoje atribui sua
modernização ao 25 de Abril ou à
integração à Europa?
Secco - As gerações mais jovens
atribuem essa modernização à
Europa. Elas querem mais do que
nunca se sentir européias. Mas é
evidente que foi o 25 de Abril que
permitiu isso.
Folha - Voltemos ao Partido Comunista. Como explicar seu patético declínio?
Secco - O PCP era a única força
politicamente organizada durante a ditadura salazarista. Depois
do 25 de Abril, ele se tornou importantíssimo, mas sua força estava na organização voltada para a
clandestinidade. Ao disputar eleições, ele não demonstra o mesmo
preparo que havia na época, por
exemplo, no Partido Comunista
Italiano.
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