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Transição na Argentina
Dificuldades do presidente eleito incluem seu próprio partido, que disputou a eleição com 3 candidatos
Apoio no Congresso preocupa Kirchner
ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES
Néstor Kirchner assume hoje a
Presidência da Argentina com um
desafio nunca antes enfrentado
por um presidente peronista: angariar apoio dentro do próprio
partido, que saiu dividido da primeira eleição presidencial da história que contou com mais de um
candidato do Partido Justicialista.
As principais dificuldades serão
enfrentadas na Câmara dos Deputados. Kirchner poderá contar
com os chamados "duhaldistas"
-ligados ao presidente Eduardo
Duhalde- , mas terá de conquistar o bloco conhecido como azul e
branco, grupo de 30 deputados
menemistas, além dos partidários
de Adolfo Rodríguez Saá, que ficou em quarto lugar no primeiro
turno das eleições.
"Não temos ânimo obstrucionista. Queremos colaborar para o
êxito do governo, mas, para que
haja uma unificação, primeiro
precisamos ver como será a condução das coisas", disse o deputado Oscar González, presidente do
bloco azul e branco.
As negociações com essa ala do
peronismo já começaram. Eduardo Camaño, presidente da Câmara, trabalhou em favor de Kirchner durante a última semana na
busca de um consenso. Kirchner
ainda terá de enfrentar o bloco conhecido como "interprovincial",
ligado a Províncias que não possuem vínculos políticos com o novo presidente.
"Os peronistas têm uma grande
quantidade de deputados, e
Kirchner terá de contar com sua
própria bancada", afirmou Alberto Natale, presidente do bloco.
No Senado, a situação não é diferente, mas Kirchner conta com
a ajuda extra da mulher, a senadora Cristina. "O peronismo está dividido, e podemos dizer que o
presidente vai contar com um período de compreensão [no Senado], mas não de apoio, nos primeiros meses de governo", afirma
o analista político Jorge Giacobi.
Outros partidos
Essa fragmentação dentro do
peronismo levou Kirchner a buscar ajuda na oposição. Ele chegou
a cogitar a oferta de cargos ao ARI
(Argentina por uma República de
Iguais), de Elisa Carrió, e à UCR
(União Cívica Radical), adversária histórica do justicialismo.
A proposta foi rechaçada por
ambos os partidos. Em comunicado, a UCR informou que faria
oposição "séria e responsável sem
ocupar cargos no governo".
O mesmo aconteceu com Carrió, que apoiaria Kirchner contra
Carlos Menem (também peronista) no segundo turno. "Seguiremos mantendo distância do governo. Faremos uma oposição
construtiva", disse.
As farpas trocadas entre Menem e Kirchner durante a campanha acentuaram mais as divisões
dentro do PJ. Kirchner acusa Menem de ter renunciado para debilitar sua governabilidade. A renúncia às vésperas do segundo
turno tirou de Kirchner a possibilidade de chegar ao poder com o
respaldo de mais de 70% dos eleitores, o que agilizaria a formação
de uma base mais ampla -e não
apenas dentro do PJ.
"Kirchner assume com legitimidade, mas limitada. Poderia ser
melhor. Ele não é um líder partidário, não tem um bloco legislativo próprio, e as condições de governabilidade serão definidas no
exercício do seu mandato", afirma Ricardo Rouvier, da Rouvier
& Associados.
Para Giacobbi, a divisão do peronismo não significa uma ruptura "eterna". "O PJ é muito sensível
ao poder, e há uma necessidade
de se manter no topo que supera
as disputas entre lideranças. Por
isso, há chances, e não são pequenas, de reversão nesse quadro."
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