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SOCIEDADE
Florencia de la V é estrela de telenovela e ganha a simpatia de uma sociedade antes conhecida por sua homofobia
Travesti vira celebridade na TV argentina
CLÁUDIA DIANNI
DE BUENOS AIRES
A mulher mais famosa da TV
argentina hoje é um travesti. Florencia de la V interpreta Laisa, a
personagem mais popular da novela "Los Roldán", uma comédia
familiar que vai ao ar todos os dias
no horário nobre na Telefé.
Desde que estreou, em fevereiro, a novela tem batido recordes
de audiência com média de 34.3
pontos, segundo a mediação do
Ibope, mas chega a atingir picos
de 40, principalmente nos capítulos que envolvem os momentos
cruciais da vida de Laisa, personagem que desbancou até a "sex-simbol" Andrea Frigerio, ex-modelo e apresentadora de TV, que
também participa do elenco.
A trama da novela se desenvolve em torno das disputas entre os
Roldáns, uma família simples de
classe média baixa, que se muda
para um bairro chique, e os sofisticados Uriartes. Laisa interpreta
a irmã travesti do chefe de família
Tito Róldan. É justamente por
Laisa que o esnobe e casado Emílio Uriarte se apaixona e perde a
memória quando flagra Laisa no
banho.
O sucesso de um travesti na televisão argentina é um fato curioso,
principalmente para uma sociedade homofóbica que, até 1998,
prendia travestis pelo simples fato
de estarem vestidos de mulher.
Em 1998, porém, o Legislativo de
Buenos Aires aprovou o "Código
de Convivência", que acaba de ser
reformado e que permitiu a circulação de prostitutas e travestis.
Travestis protestam
"O travestismo da novela é aceito pela sociedade porque vem em
uma versão "light", longe da realidade de violência social e preconceito a que são submetidos", diz a
antropóloga Josefina Fernandes,
autora do livro "Corpos Desobedientes", que discute os travestis.
"O sucesso de Laisa foi uma surpresa. Acho que a simpatia do público se deve ao fato de que Laisa
mostra o lado humano dos travestis. Ela é só mais um membro
da família, que tem uma vida normal e vive um drama por causa de
sua condição sexual. Laisa não é
um personagem erótico, portanto, não choca", disse Mario Schajris, um dos autores da novela.
Para a especialista em TV do
curso de comunicação da Universidade de Buenos Aires, Nora
Mazzioti, é justamente pela falta
de erotismo em seu personagem
que o público aceita um travesti
como celebridade. "Ao mesmo
tempo em que ela mexe com fantasia das pessoas, por sua ambigüidade sexual, é um personagem
do tipo simpático, quase infantil,
portanto não causa confrontos
com as mulheres, por exemplo."
Franca, sorridente e sem trejeitos exagerados, Florencia faz mais
o gênero Rogéria, o famoso travesti brasileiro que, como ela, iniciou a carreira no teatro de revista, do que o estilo "sex-simbol" de
Roberta Close.
Apesar da fama, Florencia não é
unanimidade. De acordo com a
presidente da Associação de Luta
pela Identidade Travesti, Lohana
Berkins, ela não representa a categoria.
"Ela reforça a imagem bufanesca do travesti que só serve para ser
vedete. Queremos ser reconhecidas como profissionais normais,
médicas, enfermeiras, professoras, que podemos ser", afirma. "A
sociedade é muito hipócrita. As
mesmas pessoas se divertem com
ela na televisão ou no teatro
apóiam a reforma do Código de
Convivência que quer cercear a
circulação dos travestis nas ruas."
Florencia iniciou-se nos palcos
de Buenos Aires aos 21 anos. Foi
em 1996 que, por um golpe de sorte, ganhou certa fama. Um produtor artístico apresentou Florencia
ao mágico inglês David Copperfield, com quem foi fotografada
em uma boate.
A mídia publicou que Copperfield, então namorado da modelo
Claudia Schiffer, havia trocada a
celebridade das passarelas internacionais por um travesti argentino. Astutamente, Florencia não
confirmou nem desmentiu a versão e acabou ganhando espaço.
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