|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Crise complica adesão russa à OMC
Ingresso depende de acordos bilaterais com todos os membros da organização, entre eles a Geórgia
Integração de Moscou já enfrentava resistência georgiana antes de conflito;
agora, EUA vêem chance de fazer pressão sobre Kremlin
MARCELO NINIO
DE GENEBRA
Os ventos de uma nova Guerra Fria trazidos pela crise no
Cáucaso devem congelar por
um bom tempo o processo de
adesão da Rússia à Organização
Mundial do Comércio (OMC),
que já se arrasta por 13 anos.
Nesta semana, Moscou e Washington trocaram farpas sobre
as perspectivas da Rússia de integrar a entidade máxima do
comércio mundial no futuro
próximo -mas o fato é que elas
já sofriam à sombra das tensões
com a Geórgia bem antes dos
últimos acontecimentos.
Num gesto interpretado como uma ação preventiva, o premiê russo, Vladimir Putin, disparou que não vê vantagens para o seu país na adesão à OMC e
ameaçou rever alguns compromissos já assumidos no processo. Para muitos analistas foi um
blefe de Putin, que preferiu fazer o primeiro movimento no
xadrez diplomático porque já
esperava que a questão da adesão à OMC se converteria em
instrumento político nas mãos
do Ocidente.
Meio de pressão
Carentes de recursos para
colocar pressão sobre Moscou,
os EUA não desperdiçaram a
oportunidade. Em entrevista à
imprensa alemã, o secretário
americano do Comércio, Carlos Gutierrez, confirmou que as
ações do Kremlin colocavam
"em risco" a adesão da Rússia à
organização. Diplomatas em
Genebra admitiram nos últimos dias que a crise derrubou o
tema para o fim da lista de prioridades na agenda da OMC.
Em tese, nenhum membro
da OMC tem o poder de veto
sobre a entrada de um novo
candidato. Na prática, entretanto, as regras da entidade
permitem que um país bloqueie o processo, já que ele envolve negociações bilaterais.
Foi o que fez a Geórgia, integrante da OMC desde 2000: para liberar o acesso da Rússia,
exigia o fim do comércio de
Moscou com os encraves separatistas da Ossétia do Sul e Abkházia. Algo que hoje, diante do
apoio do Kremlin à independência das duas regiões separatistas, parece impensável.
Etapas para a adesão
A "ascensão" de um novo
membro à OMC, como é conhecido o processo no jargão
da entidade, segue quatro estágios. No primeiro, o país candidato apresenta suas práticas
comerciais a uma comissão,
que é aberta à participação de
qualquer um dos 153 membros.
No segundo, ocorrem as negociações bilaterais. Em seguida,
os acordos obtidos são resumidos num protocolo de ascensão. O estágio final é a apresentação desse protocolo ao Conselho Geral da entidade, no
qual é necessária a aprovação
de dois terços dos membros para que a adesão seja consumada. O mais recente integrante é
Cabo Verde, que completou o
processo no mês passado.
O atrito com a Geórgia é o entrave mais visível para a permanência da Rússia no segundo
estágio, mas não é o único. Entre outras razões para o atraso
em sua adesão estão as regras
que permitem monopólios como o do gigante estatal Gazprom, tarifas de exportação e
subsídios agrícolas.
Embora se esforce para que a
política não contamine seu trabalho como mediador, o diretor-geral da OMC, Pascal
Lamy, costuma dizer que a organização, no final das contas,
tem mais a ver com guerra e paz
do que com bananas. A tensão
entre Geórgia e Rússia só comprova que comércio e política
são inseparáveis.
Texto Anterior: Sem aceitação nem recursos, Abkházia e Ossétia do Sul são inviáveis como países Próximo Texto: Casa Branca volta a deplorar reação russa no Cáucaso Índice
|