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Notícia, promoção
Uma reportagem publicada
na Ilustrada em 21/1 anunciava
dois megaeventos de música eletrônica, um para março, no Rio,
outro para setembro, em São
Paulo. Ambos patrocinados pela multinacional de celulares
Nokia, conforme o texto, dentro
do projeto Nokia Trends, uma
"série de eventos focados em
atrações de ponta do universo
da música de pista".
O texto, além disso, registrava
a criação de um site, como "ferramenta de apoio aos eventos",
e dava o endereço na internet.
Nada chama muito a atenção
aí, a não ser que o texto era assinado por uma jornalista sócia
de uma empresa que participou
da criação do referido site e que
é, justamente, a fornecedora do
material jornalístico do mesmo.
A Folha, ao tomar conhecimento disso, por meio de uma
pessoa de fora do jornal, decidiu
suspender a colaboração da jornalista (free-lancer), por considerar que essa conjunção implicava um conflito de interesses,
colocando em xeque a credibilidade do jornal.
O "Manual da Redação", com
efeito, veta a todo jornalista "escrever sobre assuntos em que tenha interesses pessoais diretos".
Ouvida pelo ombudsman, a
repórter, Cláudia Assef, cinco
anos de Folha, ex-correspondente-bolsista em Paris, afirma
que não ocultou deliberadamente do jornal a sua relação
com a Nokia.
"Talvez tenha sido ingênua ao
não dar atenção para isso", diz
ela. "Se tivesse pensado mais, teria sugerido a inclusão dessa informação no pé do texto, para
efeito de transparência. Mas nada disso mudaria o conteúdo do
que escrevi e a importância das
informações. Não tenho nenhum interesse pessoal direto
nisso tudo".
O problema, num caso como
esse, não diz respeito tanto ao
que cada jornalista pensa sobre
si mesmo. A questão é objetiva:
como convencer o leitor da independência a respeito de um
evento sendo parte integrante,
de uma forma ou de outra, do
mesmo? Como convencê-lo de
que se está escrevendo pela notícia em si e não porque se tem laços com o fato divulgado?
Ao jornalista, não basta ser
ético ou íntegro. É preciso, além
disso, escancarar essa condição
para o público, sempre. Pois a
simples aparência de haver algum conflito de interesses já é
mortal para a credibilidade.
Além de suspender a colaboração, a direção do jornal informa ter pedido "empenho" ao
conjunto de editores no sentido
de "redobrar esforço para checar se eventuais ligações pessoais e/ou profissionais dos colaboradores implicam conflito de
interesses" e "evitar citações
desnecessárias de patrocinadores em textos jornalísticos que
podem resultar numa leitura
promocional".
Medidas corretas que, a meu
ver, deveriam ser renovadas periodicamente, não apenas como
reação a fatos consumados.
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Bernardo Ajzenberg é o ombudsman da Folha. O ombudsman tem mandato
de um ano, renovável por mais dois. Ele não pode ser demitido durante o exercício do cargo e tem estabilidade
por seis meses após o exercício da função. Suas atribuições são criticar o jornal sob a perspectiva do leitor
-recebendo e verificando as reclamações que ele encaminha à Redação- e comentar, aos domingos, o noticiário
dos meios de comunicação.
Cartas: al. Barão de Limeira 425, 8º andar, São Paulo, SP CEP 01202-900, a/c Bernardo Ajzenberg/ombudsman,
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