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CLÓVIS ROSSI
Mais que duas torres
MADRI - Os atentados de 11 de Setembro mudaram a mentalidade norte-americana de uma maneira ainda
não totalmente avaliada.
A mais recente evidência foi dada
na convenção democrata que formalizou a candidatura de John Kerry.
Ele abriu a sua participação no show
final afirmando que estava "reporting for duty", apresentando-se para
cumprir o dever, uma expressão tipicamente militar.
No caso específico, o dever de ser comandante-em-chefe, como cabe ao
presidente da República.
À primeira vista nada de errado
com esse tipo de apresentação. O problema é que ser comandante-em-chefe deveria ser o acessório, não o essencial. O essencial deveria ser a Presidência e todos os demais deveres que
ela carrega.
Mas, em um país ainda traumatizado pelo 11 de Setembro e todos os
seus desdobramentos, bater continência e ser um guerreiro é, talvez,
central para ganhar a eleição.
É verdade que Kerry, na continuação do show, pôs toda a ênfase em devolver a credibilidade à Casa Branca,
seriamente afetada (mais no exterior
do que nos próprios EUA) pelas mentiras pós-11 de Setembro e pelas turvas relações econômicas com empresas que estão ganhando muito dinheiro com a reconstrução do Iraque
que a Casa Branca de Bush destruiu.
Aí, sim, é o presidente falando, não
o comandante-em-chefe. Mas colou
pouco. O jornal "The Washington
Post" publicou ontem resultados de
uma pesquisa qualitativa que mostra
que o discurso de Kerry agradou, mas
não o suficiente para conquistar o voto dos pesquisados.
O que devolve a questão ao terreno
militar: em outros tempos, um governo norte-americano que tivesse mentido tanto e tergiversado tanto teria
desabado rapidamente (prova-o o
caso Richard Nixon/Watergate).
Agora, no entanto, Bush continua colado em Kerry.
Tudo somado, parece que ruíram
muito mais que duas torres.
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