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CARLOS HEITOR CONY
Caveiras e morcegos
RIO DE JANEIRO - Os saudosistas de todos os tamanhos e feitios, e seus assemelhados, costumam lamentar que o Carnaval de hoje não se compara
ao de antigamente. Citam as marchinhas alegres, as fantasias extravagantes, as casas enfeitadas de serpentinas, os lança-perfumes.
Pela faixa etária, eu deveria engrossar a turma nostálgica, embora
não seja nostálgico, mas dado a melancolias várias e sofridas.
Contudo não sou dos que atiram
pedras no Carnaval de agora. Ele é
cômodo: basta desligar a TV e ele deixa de existir. E, se tenho a telinha iluminada, vejo coisas deslumbrantes,
não exatamente as fantasias e as alegorias, mas o mulherio farto e suculento que nos é servido em close.
Já nos Carnavais de outrora, se havia um cheiro de lança-perfume no
ar e as melodias eram melhores, para
compensar havia uma multidão de
caveiras e de morcegos espalhados
por todas as ruas e bairros e nos bondes, e, de repente, entrava uma caveira saliente dentro de nossa casa, com
uma vela na mão e um pires na outra, no qual o pai pingava sempre uns
tostões.
Eu tinha pavor das caveiras. Quando as pequenas fogueiras nas calçadas começavam a esquentar os tamborins para os ensaios que anunciavam um novo Carnaval, eu começava a suar frio, temendo as caveiras
com suas mortalhas brancas, a cruz
preta nas costas, o gargalhar de um
outro mundo que não era o meu.
Também tinha medo dos morcegos.
Para perder o medo, num Carnaval
dos anos mais antigos do passado,
aceitei a máscara de morcego que fedia a papelão e cola. O pai a comprara para mim e ficara orgulhoso porque o filho, na opinião dele, era um
"homem".
Saí pelas ruas de Paquetá para assustar outros meninos como eu. De
repente, ao dobrar a esquina da rua
Tomás Cerqueira com a praia de São
Roque, em cuja igrejinha meus pais
se casaram, esbarrei em outro morcego. Corri. Acho que estou correndo
até hoje.
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