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CARLOS HEITOR CONY
O que ele não disse
RIO DE JANEIRO - O maior gênio
que andou por nossas terras foi o jesuíta Antônio Vieira, do qual estamos comemorando os 400 anos de
seu nascimento. Imperador da nossa língua, segundo Fernando Pessoa, foi mais brasileiro do que português. Será redundante comentar
sua personalidade e sua obra. Pinço
apenas um pequeno trecho de um
de seus sermões: "Isto foi o que
Cristo disse. Atentai agora para o
que ele não disse".
E vai por aí, dizendo tudo o que
desejava dizer. Creio que Machado
de Assis pegou este achado e fez toda a sua obra na base do que os outros, dizendo muitas coisas, muitas
coisas deixavam de dizer. E ele foi o
primeiro a dizer e a deixar o importante sem dizer.
No dia-a-dia do que ouvimos ou
lemos em diversos veículos de comunicação (imprensa, rádio, televisão, internet, publicidade), o mais
importante não é o que fica dito,
mas aquilo que não é dito. Governantes, políticos, formadores de
opinião, costureiros, cozinheiros,
filósofos e ensaístas de todos os tamanhos e feitios costumam falar
muito e não dizer nada. É desse nada que é feita a história e o mundo.
Gosto de um pequeno trecho de
"Terra Desolada" (T.S. Eliot): "Que
rumor é este?/ O vento sob a porta/
E que rumor é este agora? Que anda
o vento a fazer lá fora?/ Nada. Como sempre, nada" (Tradução de
Ivan Junqueira).
Segundo a lição de Vieira, devemos estar sempre atentos para tudo
aquilo que não é dito. No fundo, é o
que realmente conta. Daí que paro
por aqui, na desvairada ilusão de
que atentarão para aquilo que não
ficou dito. E, mesmo que ninguém
atente para o dito ou para o não dito, o resultado é o mesmo: nada.
PS - Depois dessa, o cronista saúda o povo e pede passagem para necessárias férias. Atentai para o que
ele não disse.
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