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CARLOS HEITOR CONY
Noites vazias
RIO DE JANEIRO - Acontece no Rio e, em escala ainda menor, em São Paulo, em cidades grandes, médias e até
mesmo em algumas pequenas: as
noites ficaram vazias. Nas metrópoles, permanecem alguns pontos de
agito noturno, onde se concentram
restaurantes e bares da moda. Mas o
resto é uma desolação, um deserto asfaltado e sinistro.
Da minha varanda aqui na Lagoa,
antigamente via o desfile da colossal
lagarta de luz dos carros que vinha
do túnel Rebouças a caminho da Zona Sul e da Barra. E, na pista contrária, a imensa cobra coral, vermelha e
negra, dos carros que se dirigiam para a Zona Norte. Era letal atravessar
as pistas. À noite todos os gatos e
transeuntes são pardos, e os motoristas vêm menos e pior.
A Lagoa funciona como um "rond
point" gigantesco, com mais de 64 entradas e saídas para o tráfego que
vem e vai para toda a cidade. Em torno da poça onde os tamoios caçavam
socós, os túneis fizeram um carrossel
urbano, que distribui grande parte
do tráfego do Rio.
E agora, a partir das 21 ou 22 horas,
justamente quando era intensa a
procura pelos cinemas, pelos bares de
Ipanema, Leblon e Barra, as duas
pistas ficam desertas, a lagarta de luz
se recolheu, a cobra coral vermelha e
preta preferiu voltar para seu ninho
noturno.
A insegurança, que ainda é relativa
ou infinitamente menor em outras
cidades, transformou o Rio, sobretudo à noite, numa cidade fantasmagórica. Só se sai à noite por um motivo
considerado maior e intransferível.
Pensa-se duas, três vezes antes de tirar o carro da garagem. E cada vez
mais gente pensa duas ou três vezes, e
o resultado são as ruas desoladas, o
asfalto vazio brilhando à luz dos postes de iluminação que parecem aumentar o nada.
Com variantes talvez mais atenuadas, em outras cidades acontece o
mesmo. Não faz muito, numa cidade
bem menor do que o Rio, fiz uma palestra à noite. Estava hospedado no
quarteirão vizinho e, findo o compromisso, quis voltar a pé para o hotel. A
instituição que me convidara colocou
dois seguranças para me acompanhar. Mesmo nas cidades pequenas,
as noites ficaram mais vazias.
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