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ELIANE CANTANHÊDE
Dois em um
BRASÍLIA - Dois presidentes brasileiros nos Estados Unidos na mesma semana, no mesmo dia, não deixa de
ser um acontecimento. E curioso.
Fernando Henrique Cardoso recebe o prêmio do PNUD (órgão da
ONU para desenvolvimento humano) e discursa com uma lista imensa
de "sucessos" na área social.
Luiz Inácio Lula da Silva encara
George W. Bush olho no olho, reafirma seu compromisso de honrar contratos e de manter a responsabilidade fiscal etc. etc. e introduz na agenda
internacional algo até agora considerado apenas para efeitos de discurso e
para alguns públicos: a miséria.
Ou seja: amanhã, em Nova York,
FHC vai dizer que fez e aconteceu na
área social e no desenvolvimento humano, enquanto, na terça-feira, em
Washington, Lula dirá que a globalização, as relações norte-sul e o continente americano estão justamente
precisando de um choque social.
As dramáticas, angustiantes, chocantes, humilhantes e ancestrais desigualdades brasileiras estarão deslocadas durante a semana, portanto,
do sul para o norte do continente, do
Brasil para os EUA. O que, não é nada, não é nada, é alguma coisa, sim.
Em vez de se sentarem para discutir
só Alca, economia e comércio, o presidente do país mais poderoso do mundo e o presidente eleito do principal
país da América do Sul estarão discutindo um outro tipo de "negócio": povo, gente.
Se isso pode render bons resultados
em termos de negociações e de relacionamentos, Lula deve ficar atento,
mais uma vez, à realidade. Aqui, no
Brasil, o que mais se ouve é que o governo FHC foi um desastre absoluto
na área social, mas o homem estará
justamente recebendo um prêmio internacional importante pelos avanços nessa área.
Ou seja: a lição que FHC deixa é
que muito foi feito, mas falta muito,
muito, muito por fazer. E a lição que
Lula tem de aprender é que, além de
bons projetos e de belas intenções, é
preciso muito, muito, muito mais para acabar com a miséria e com as desigualdades. O risco é ser reconhecido
lá fora e ser derrotado aqui dentro.
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