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CARLOS HEITOR CONY
Evitando o calvário
RIO DE JANEIRO - Drama suplementar na carreira de alguém que se
transforma num ex-presidente da República. A perda do poder, o esvaziamento definitivo de sua caneta cheia
de tinta para nomear, a ausência de
mordomias várias -são muitos os
motivos para a melancolia de quem
deixa de ser poderoso.
Mas há, como disse acima, um drama suplementar, que torna enigmática a situação de um ex. É a possibilidade das vendetas, dos inquéritos, das
acusações, torpes algumas, discutíveis
outras, todas possíveis num clima de
mudança de guardas.
Não há dispositivo constitucional
que preserve o ex-mandatário do calvário das suspeitas e das acusações.
Para evitar mal maior, os ex costumam buscar imunidade num mandato parlamentar -o que não cola
bem para as instituições.
FHC poderia ter tentado um mandato qualquer, mas, confiante em sua
capacidade de seduzir adversários, de
articular nos bastidores, ele preferiu
negociar sua tranquilidade com acordos que, tudo indica, serão respeitados pelos novos detentores do poder.
Quando empossou-se na Presidência, Jânio Quadros ameaçou mundos
e fundos, abriu inquéritos e sindicâncias que tornariam a vida do antecessor um inferno. Afinal, JK construíra
Brasília, hidrelétricas, rasgara o território nacional com estradas, movimentara muito dinheiro. Impossível,
segundo a ótica dos janistas, que não
houvesse alguma irregularidade em
tantas obras, que a oposição considerava faraônicas
Crise no abastecimento obrigara o
governo a comprar algumas toneladas de feijão no mercado internacional. Parte do feijão estava estragado e
foi objeto de inquérito contra JK.
FHC não deixou obra nenhuma.
Seu carro-chefe -o controle da inflação- teve um custo altíssimo e foi
obra efêmera, cujo prazo de validade
se está esgotando. Mesmo assim, é natural que ele faça negociações para
evitar inquéritos e processos. (O cronista ficará ausente desta coluna por
uma semana.)
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