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FÁBRICA DE ÓRGÃOS
Até meados dos anos 80,
transplantes de órgãos eram
tratamentos apenas experimentais.
O fenômeno da rejeição, pelo qual o
sistema imunológico do receptor
combate o órgão enxertado como
um corpo invasor, comprometia seriamente a sobrevida do paciente.
Com a descoberta de novas drogas
imunossupressoras, notadamente a
ciclosporina, transplantes de vários
órgãos tornaram-se uma alternativa
viável de tratamento.
As maiores barreiras à difusão da
técnica são a baixa oferta de órgãos e
os efeitos colaterais da imunossupressão. A ciclosporina tem ação nefrotóxica e carcinogênica, o que pode
a longo prazo inviabilizar o tratamento. Ela também reduz a qualidade de vida do transplantado, que se
torna vítima de infecções frequentes.
Se houvesse como criar uma oferta
ilimitada de órgãos que não provocassem rejeição, boa parte das doenças campeãs de mortalidade se tornaria coisa do passado. Essa possibilidade, que poucos anos atrás seria
considerada fruto da imaginação de
autores de ficção científica, existe,
ainda que seja técnica extremamente
incipiente, sujeita a dificuldades de
que ainda nem se suspeita.
A promessa vem da clonagem terapêutica. Células dos primeiros estágios de desenvolvimento do embrião
são totalmente indiferenciadas, isto
é, têm a capacidade de converter-se
em qualquer tipo de tecido. Pesquisadores agora vêm descobrindo formas, ainda muito rudimentares, de
criar tecidos de interesse médico.
Em princípio, não seria preciso
empregar técnicas de clonagem para
obter células indiferenciadas. Elas
poderiam vir de qualquer embrião. A
clonagem entra para garantir que as
células utilizadas sejam desenvolvidas a partir do próprio corpo do paciente, o que eliminaria a rejeição.
Na semana passada, a revista "Nature Biotechnology" publicou estudo
de Anthony Atala, da Universidade
Harvard, e de Robert Lanza, da empresa Advanced Cell Technology, em
que os pesquisadores relatam como,
usando a clonagem, foram capazes
de criar órgãos semelhantes a pequenos rins em uma vaca.
O experimento funcionou até melhor do que o esperado, porque as células renais desenvolvidas se mostraram funcionais. Produziram urina.
Como o material que deu origem aos
novos órgãos foi retirado da própria
vaca, não houve rejeição.
Apesar de passos promissores como esse, é forte em todo o mundo a
pressão de setores conservadores para proibir todos os tipos de clonagem. Esses grupos não diferenciam
essa clonagem terapêutica da reprodutiva, isto é, a que teria como objetivo gerar réplicas humanas.
A clonagem reprodutiva é, de fato,
no atual estágio da ciência, uma
aventura irresponsável que implica
graves desvios éticos. Já a clonagem
terapêutica é pesquisa legítima. Tem
o apoio das mais sérias instituições
científicas do planeta. Se o cenário
mais otimista se concretizar, a clonagem terapêutica será, também, o
mais perto que a humanidade chegou da mítica panacéia, o remédio
que cura todos os males.
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