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VINICIUS TORRES FREIRE
Bichos de duas cabeças?
SÃO PAULO - Haveria o risco de a diplomacia brasileira estar virando um
bicho janicéfalo, um monstro de duas
cabeças (janicéfalo, de Jano, o deus
romano de duas faces)?
Trata-se, por ora, apenas de uma
dúvida. Mas tornou-se claro, depois
de algumas nomeações para o governo de Lula da Silva, que certas burocracias contam agora com figuras de
orientação a princípio opostas, de linhas teóricas diferentes, ao menos incongruentes no conteúdo político. Há
exemplos ou ameaças disso no segundo escalão do Ministério da Fazenda
e no Ministério do Desenvolvimento/
BNDES.
Na diplomacia, a hábil e competente personalidade do embaixador e
ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, embora mais à esquerda
que a de seus antecessores, parece apta a conciliar a necessidade de mais
independência na política externa
com pragmatismo.
Amorim tem como seu secretário-executivo o deveras esquerdista Samuel Pinheiro Guimarães, motivo de
séria crise no insípido, inodoro e incolor Itamaraty de Celso Lafer e
FHC. Mas tem também o muitíssimo
mais pragmático Clodoaldo Hugueney no comando de negociações comerciais. Mais, a diplomacia nacional conta agora com um assessor especial da Presidência, Marco Aurélio
Garcia, muito próximo de Lula, obviamente à esquerda.
Nos bastidores da investida brasileira na Venezuela há impressão de
ruído, que pode ser apenas isso. Pode
bem não ser. Garcia parece mais pró-Chávez. O Itamaraty, talvez até por
ter funções executivas, parece mais
cauteloso. De resto, a intenção dos
norte-americanos de voltarem a ser
publicamente ativos na Venezuela
suscitou ainda mais dúvida.
Os EUA se irritaram com o fato de o
Brasil ter colocado suas asas de fora e
trataram de arrumar uma política
em contraposição? Parte da diplomacia discute com os norte-americanos
um encaminhamento do salseiro venezuelano, enquanto outra parte
não quer saber dos EUA?
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