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DOPING OLÍMPICO
As últimas edições dos Jogos
Olímpicos foram marcadas pelo cabo-de-guerra entre autoridades
do COI (Comitê Olímpico Internacional) encarregadas de prevenir e
combater o doping e cientistas e atletas dispostos a desenvolver e utilizar
novas drogas e técnicas capazes de
melhorar o desempenho dos competidores. Assim como a primeira tranca engendrou o primeiro pé-de-cabra, essa é uma disputa fadada a não
ter fim. Nem vitoriosos.
O caráter quase insolúvel do problema não dispensa um exame mais
aproximado dos critérios internacionais para o doping. O COI considera
doping o "uso de expediente que seja
potencialmente danoso à saúde do
atleta e/ou capaz de melhorar sua
performance". É aqui que começam
as dificuldades.
Evitar que um competidor obtenha
vantagem indevida é plenamente justificável sob a ética esportiva. Até
prova em contrário, um embate
olímpico deve dar-se entre atletas, e
não entre farmacêuticos. Mas será
que cabe a organizações esportivas
zelar pela saúde dos atletas, ou essa
seria uma tutela indevida?
Maconha, álcool e heroína figuram
entre as drogas controladas, mas o
efeito desses produtos sobre o desempenho do competidor tende a ser
negativo. Proibir esse gênero de
substâncias parece, assim, muito
mais uma questão moral do que propriamente esportiva. E, quando o
campo da discussão passa a ser a
moral, caberia perguntar se é ético
tentar controlar a vida privada ou social dos atletas. Se admitimos que cabe ao COI cuidar da saúde dos competidores, amanhã a organização
poderá tentar legislar sobre a quantidade de sal ou o teor de gordura da
dieta dos esportistas.
Mesmo a questão da vantagem indevida não é trivial. Um bom método
de melhorar o desempenho de atletas é aumentar o número de glóbulos
vermelhos no sangue. Para isso, existem diversos métodos (transfusões
de sangue e hemoderivados) e drogas (eritropoietina), todos devidamente proibidos. Só que efeito análogo pode ser obtido se o atleta se
mudar, por exemplo, para uma cidade localizada em região de grande altitude, como são La Paz ou Lhasa.
Obviamente, o COI não cogita de
proibir a participação de bolivianos
ou tibetanos nos jogos.
É claro que o doping é indefensável. Mas parece igualmente evidente
que o COI, ao misturar questões morais -ainda que reforçadas pelo fato
de que atletas são vistos como exemplo a imitar- com a regulação esportiva, não contribui como deveria
para combater essa prática desleal.
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