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CLÓVIS ROSSI
A "segundona" e a vergonha
MIAMI - Em matéria de Alca (Área de Livre Comércio das Américas), sabe qual é a grande diferença entre
brasileiros e norte-americanos? Simples: a vergonha (ou a falta dela).
Basta saber que o governador da
Flórida, Jeb Bush, irmão do presidente da República, disse, faz poucos
dias, aos produtores de frutas e vegetais do Estado que vai defender, "sem
vergonha" ("shamelessly"), o protecionismo aos ruralistas de seu Estado
(e, por extensão, do país).
No Brasil, ao contrário, empresários, autoridades, acadêmicos e até
jornalistas têm vergonha de falar em
protecionismo. Bobagem. Não há
país hoje rico que não tenha usado o
protecionismo como um dos instrumentos para ficar rico.
Aos que duvidam, sugiro a leitura
de "Kicking Away the Ladder" (chutando longe a escada), de Ha-Joon
Chang. Não se preocupe, pois não se
trata de um perigoso comunista, mas
de um acadêmico da Universidade
de Cambridge com passagens por
postos importantes no Banco Mundial, em agências da ONU e no Banco
de Desenvolvimento da Ásia.
A tese de Chang, apoiada em fatos,
é a de que os países hoje ricos tratam
de evitar que os menos ricos usem
instrumentos similares aos que eles
usaram para enriquecer.
A fala de Jeb Bush aos agricultores
da Flórida é ilustrativa da tese: vamos abrir os mercados dos outros,
mas vamos proteger os nossos citricultores e produtores de açúcar, os
dois grandes setores do agronegócio
no Estado.
Enquanto isso, no Brasil, fica quase
todo mundo com vergonha de defender até o próprio quintal, quanto
mais de chegar a esse grau de incoerência entre teoria e prática.
Vai ver que é por isso que o Brasil
não sai da "segundona", para usar a
expressão de Joaquim Levy, o assessor do ministro Palocci, que, no entanto, acredita que tudo é apenas um
problema de contas públicas. Assim,
continuaremos na "segundona".
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