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CIÊNCIA E ARTE
Como toda atividade humana,
a medicina está sujeita a modismos, achismos e até mesmo a certas pajelanças. Na verdade, o caráter
científico da medicina é bastante recente. Até pouco mais de cem anos,
medalhões da medicina ainda duvidavam da idéia de que microrganismos pudessem causar doenças.
Foi só com o trabalho de homens
como Louis Pasteur (1822-1895), Ignaz Semmelweis (1818-1865) e Robert Koch (1843-1910) que se estabeleceu para além de qualquer dúvida
que vírus e bactérias estavam envolvidos em processos infecciosos. E a revolução bacteriológica foi apenas um
primeiro passo no processo ainda
não-concluído de tornar a medicina
algo mais científico.
Uma mudança fundamental sobreveio nos anos 70 com o trabalho do
professor britânico Archie Cochrane, que inaugurou a era da chamada
medicina baseada em evidências. Por
esse conceito, não basta seguir práticas médicas consagradas. É preciso,
antes, provar que elas são efetivas.
Provas na medicina baseada em
evidências costumam ter expressão
estatística. Para que fique demonstrado que um determinado tratamento para câncer é eficiente, é preciso que ele aumente a sobrevida de
um grupo significativo de pacientes
quando comparado a um grupo que
não recebeu a terapia. Por vezes, práticas as mais arraigadas da medicina
não recebem uma boa confirmação
estatística.
É o caso, por exemplo, de alguns tipos de "check-ups" anuais. O título
de uma reportagem publicada nesta
semana pelo jornal "The New York
Times" lança o debate: ""Check-ups"
médicos anuais podem ser um ritual
vazio". Ainda não existe indicação
segura de que essas extensas baterias
de exames aumentem a sobrevida de
pacientes. Há até casos em que o excesso de testes pode ser prejudicial.
Um exemplo: de 5% a 10% de mulheres sem sintomas de infecção urinária apresentarão cultura positiva para
bactérias. Tratá-las com antibióticos
não faz muita diferença. A bactéria,
que não causaria grandes danos, tende a voltar com a interrupção da terapia. Ficam apenas os efeitos adversos
dos antibióticos.
Nada disso significa que se deva
abandonar ou condenar o acompanhamento regular da saúde, o que
seria um contra-senso. Exames obviamente são úteis para prevenir
doenças e devem ser feitos. O melhor
é que o paciente siga a orientação do
médico, que, após boa anamnese,
deveria solicitar os exames compatíveis com a história daquela pessoa.
A medicina é um campo do saber
que tem muito a ganhar ao tornar
seus procedimentos cada vez mais
científicos. O progresso verificado
desde o século 19 é de fato impressionante. Por lidar, porém, com pessoas, com seus receios profundos e
sentimentos mais íntimos, a medicina conservar-se-á para sempre também como uma espécie de arte.
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