São Paulo, domingo, 18 de abril de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Tratamento de choque

BRASÍLIA - É uma questão de mais tempo, menos tempo, mas o Exército vai acabar entrando de alguma forma no combate ao crime organizado no Rio. Devagar e sempre, o governo Lula vem discutindo essa possibilidade, articulando consensos internos e preparando o terreno jurídico para permitir uma operação, digamos, sem dor. Ou seja: que seja aceita politicamente dentro e fora do governo.
Querer, ninguém quer. É claro que a decisão é dificílima, em especial porque se trata de um governo que se diz de esquerda, de um governo do PT, de um governo Lula. Botar o Exército na rua tem uma conotação ruim e gera uma natural polêmica. Além dos riscos.
Mas não tem muito jeito com essa rotina de anos e anos de invasões das favelas, de guerras de quadrilhas, de mortes de civis à toda hora. A situação, apesar dos discursos oficiais tanto do governo federal como do governo do Rio, está evidentemente fora de controle. E não é de hoje.
Então, que seja o menos drasticamente possível, obedecendo regras básicas: 1) o pedido tem de partir dos governadores Garotinho; 2) o comando da operação, seja ela qual for, terá de estar nas mãos do próprio Exército, jamais do governo estadual; 3) não haveria uma ocupação de morros e favelas com o Exército administrando o inadministrável; 4) as ações seriam pontuais, rigorosamente delimitadas no tempo e no espaço, com caráter de presença e inibição, não de ataque. Por motivos óbvios.
Lula deu sinal verde para a avaliação de prós e contras, o reticente Márcio Thomaz Bastos passou a ouvir todo mundo a respeito, o diplomático José Viegas vem consultando os comandos militares. Ninguém fala nada abertamente, mas a questão é discutida intensamente.
O fim do regime militar é razoavelmente recente e os traumas são de todos os lados. Mas não dá para continuar fingindo que a violência do Rio vai ser resolvida com soluções tradicionais. Nem cruzar os braços enquanto a distribuição de renda não vem. A questão é urgente. E de vida ou morte.


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