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CARLOS HEITOR CONY
Os clarins da banda militar
RIO DE JANEIRO - Na virada do
ano 2000, a Rede Globo fez uma enquete para saber qual teria sido a
música popular mais importante do
século 20. Deu "Aquarela do Brasil"
na cabeça, votação que só não foi
unânime porque um dos questionados votou em outra. Na ocasião,
acompanhei a maioria, mas, em segundo lugar, por gosto estritamente pessoal, coloquei "Dora", de Dorival Caymmi.
Não tenho certeza, mas acho que,
para a medalha de prata, a citada
maioria dividiu-se entre o "Carinhoso", de Pixinguinha, e "Asa
Branca", de Luiz Gonzaga.
Fiquei mesmo com a rainha do
frevo e do maracatu, maravilhosa
incursão de Caymmi ao Recife dos
rios cortados de pontes, do bairro
das fontes coloniais. Difícil escolher
uma entre as obras-primas de sua
produção. Para todos os efeitos, ele
ficará como o cantor da Bahia, de
seu mar e de suas jangadas, de suas
baianas e de seus acarajés.
"Os clarins da banda militar tocam para anunciar: sua Dora agora
vai passar, venham ver o que é
bom..." -um quadro dos melhores
de nossa história, com um pouco de
Manuel Bandeira.
A musicalidade de Caymmi era
estonteante, sempre me impressionou. Estava fincada no cancioneiro
popular, mas tinha raízes em clássicos, como Grieg, que ele próprio admitia como uma de suas influências. Neste particular, "O Mar" é totalmente Grieg e só remotamente
lembra Debussy.
No final dos anos 50, Caymmi
gravou um vinil com Ary Barroso,
um interpretando composições do
outro; Ary ao piano, e Caymmi com
a voz, o violão e aquele jeito de respirar que era só dele. No final de
"Tu", ele improvisa um largo trecho
com a boca fechada. O próprio Ary
reconheceu que o improviso de
Caymmi era o melhor de todo o disco e confessou: "Eu não sabia que
havia feito uma música tão bonita".
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