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DOUTRINA EM XEQUE
Enquanto George W. Bush e
Tony Blair buscam reunir o que
sobrou da argumentação usada para
invadir o Iraque, agora dizendo que a
guerra terá valido a pena mesmo se
jamais forem encontradas as alegadas armas de destruição em massa, o
quadro no território iraquiano desagrega-se aceleradamente.
O comando norte-americano já reconhece que suas tropas não enfrentam ações isoladas, mas, sim, resistência treinada em táticas de guerrilha. Ao aviso de Washington de que a
permanência no Iraque será estendida, soldados responderam com um
desânimo que faz lembrar a campanha no Vietnã. Um deles declarou à
televisão que, se estivesse diante do
secretário da Defesa, "eu lhe perguntaria por que ainda estamos aqui".
Aos reveses militares soma-se a dificuldade em estabelecer alguma forma de governo local que, embora
sem poder de fato, consiga administrar um país destruído -onde, de
acordo com a Human Rights Watch,
cresce a violência contra as mulheres
e em especial o número de estupros.
Visto pela população como representante dos interesses dos EUA, o
recém-empossado Conselho de Governo não pararia em pé sem a ocupação anglo-americana.
Sobre todas essas vicissitudes paira
o fantasma de Saddam Hussein. O
ditador deposto junta-se a Osama
bin Laden na galeria de arquiinimigos que os EUA, a despeito de seu
poderio, ainda não conseguiram localizar. Na ofensiva militar encerrada
em 1º de maio, os aliados deslocaram-se do sul do Iraque até Bagdá.
Nesse trajeto, pouco combate travaram com as tropas leais a Saddam,
estacionadas ao norte no chamado
"triângulo sunita". É esse o núcleo
da resistência às forças de ocupação.
Nos EUA, pesquisas em série indicam a crescente impaciência da opinião pública, em parte fundada nas
evidências de que o governo mentiu,
mas principalmente motivada pelas
mortes quase diárias de soldados
norte-americanos -que já superam
as da Guerra do Golfo.
Primeiro experimento prático da
chamada doutrina Bush, que prega
"ações preventivas" contra países supostamente capazes de atingir a segurança norte-americana, o Iraque
revela-se problema cada dia maior.
O Pentágono estuda treinar forças
de segurança privadas para aliviar os
soldados de parte de suas atribuições. Na sexta-feira, Washington defendeu publicamente, pela primeira
vez, um "papel maior" no país para a
ONU -o mesmo organismo ignorado na hora de atacar e posto de lado no momento de decidir quem
mandaria no território ocupado.
É certo que os EUA não querem
nem podem, ao menos no momento, retirar-se do Iraque. Mas, disposto a reeleger-se em 2004, Bush buscará "socializar" prejuízos para minimizar os riscos de derrota.
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